ACÓRDÃO. Rio de Janeiro, 15 / 04 / Des. Cristina Tereza Gaulia. Relator

Transcrição

1 5ª CÂMARA CÍVEL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº: ª VARA DE TRÊS RIOS Agravante: Município de Três Rios Agravado: Elimar Santos de Carvalho Juiz: Dra. Ana Carolina Gantois Cardoso Relator: Ementa: Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer c.c pedido de tutela antecipada movida em face do Município de Três Rios. Autor que contrata os serviços particulares de odontólogo para se submeter a tratamento ortodôntico (fixação de implantes e colocação de prótese dentária). Fixação deficitária de alguns dos implantes. Necessidade de novo tratamento, este com finalidade reparatória, para reconstrução tecidual e recolocação de implantes. Tutela antecipatória concedida pelo juízo de 1º grau determinando que o município ofereça o tratamento indicado ao autor em estabelecimento da rede pública de saúde e, em caso de impossibilidade, que arque com os custos em clínica da rede privada. Inexistência nos autos de diagnóstico médico atestando a urgência e/ou emergência do tratamento odontológico. Ausência de preenchimento dos requisitos essenciais ao deferimento da antecipação da tutela, na forma do art. 273 CPC. Decisão reformada. Agravo provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os argumentos do agravo de instrumento de referência, em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por, em DAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto do Relator. Rio de Janeiro, 15 / 04 / Relator

2 RELATÓRIO Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Município de Três Rios à decisão da 2ª Vara da mesma comarca que, na ação de obrigação de fazer que lhe move Elimar Santos de Carvalho, deferiu o pedido de tutela antecipada, para determinar ao ente federativo que, através da Secretaria Municipal de Saúde, promova, no prazo de 20 dias, a implementação dos procedimentos cirúrgicos e de implante dentário prescrito ao autor, em clínica conveniada ao Sistema Único de Saúde, determinando outrossim que, em caso de impossibilidade de realização do tratamento na rede pública de saúde, seja o autor encaminhado à clínica odontológica da rede privada, devendo o réu custear todo o tratamento, pena de multa mensal de R$ 200,00 e configuração de crime de prevaricação. O agravante aduz que os documentos apresentados pelo autor, ora agravado, não indicam a urgência do tratamento dentário pretendido, não sendo portanto cabível o deferimento da medida excepcional da antecipação de tutela pretendida; que não compete ao município, isoladamente, prover as necessidades assistenciais dos cidadãos na área da saúde em sua integralidade visto que os serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e integralizada; que o Decreto 7508/11, que regulamentou a Lei 8080/90, em seu art. 7º estabelece que as redes de atenção à saúde estarão compreendidas no âmbito de uma região de saúde, ou de várias delas, em consonância com diretrizes pactuadas nas comissões intergestores ; que o caso clínico em foco não se enquadra como situação de urgência ou emergência, pois se trata de procedimento odontológico eletivo, não restando caracterizado o periculum in mora; que o laudo emitido pelo SUS, por solicitação da própria Defensoria Pública, declara que foi constatado que os implantes estão osteointegrados, não havendo necessidade no presente momento de intervenção cirúrgica, o que foi confirmado na avaliação efetuada pela equipe multidisciplinar da rede SUS, composta por periodontista, ordotondista, cirurgião maxilofacial e implantista; que, diante disso, deve o agravado ingressar no SUS pelas portas de entrada do sistema, respeitando-se a igualdade de todos sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie ; que deve ser observado o caráter de irreversibilidade da tutela antecipatória concedida em 1º grau; que, ademais, o prazo fixado na decisão, bem como o valor da multa imposta, não se mostram razoáveis em relação à Fazenda Pública; que o efeito suspensivo ao presente agravo deve ser deferido, em face do risco de lesão grave e de difícil reparação ao erário municipal. Requer a suspensão liminar do decisum e, no mérito, a revogação da concessão da tutela antecipada. 20). Decisão do Relator indeferindo o efeito suspensivo (fl. Processado o agravo, vieram as informações. É o relatório.

3 A controvérsia exige verificar se o Município de Três Rios, ora agravante, tem o dever de oferecer o tratamento ortodôntico pretendido pelo agravado, consistente em recuperação de perda óssea e recolocação de implantes. Dos documentos apresentados pelo autor nos autos do processo originário observa-se que o mesmo submeteu-se a tratamento dentário/ortodôntico, realizado por dentista particular, consistente na colocação de implantes, e que alguns destes não obtiveram a devida fixação em virtude de o paciente, à ocasião, apresentar perda de massa óssea. A radiografia panorâmica juntada à fl. 28 dos mesmos autos revela que os parafusos pertencentes a dois dos implantes frontais não estão inseridos dentro da gengiva, o que por certo deveria ocorrer, registrando o respectivo laudo que o paciente não possuía massa óssea suficiente para suportar a fixação do referido material metálico. Diante disso, pretende o agravado submeter-se a um segundo procedimento cirúrgico, para refixação dos implantes que não aderiram adequada e suficientemente, com base na avaliação odontológica realizada por um outro dentista, este da rede privada de saúde (doc. às fls. 22/23) que após exame concluiu que, em virtude da grave perda óssea e gengival não seria recomendável a tentativa de reconstrução sobre os implantes já realizados, mas sim, a retirada dos referidos implantes, a reconstrução tecidual e a instalação de novos implantes. Diante disso, depreende-se que a primeira intervenção cirúrgica a que se submeteu o agravado, com a finalidade de colocação de implantes e próteses dentárias, não foi eficiente, caso contrário não haveria necessidade de reparação em curto espaço de tempo cerca de apenas um ano, já que a intervenção dentária anterior ocorreu em março de Sublinhe-se que não há nos autos comprovação de que o agravado tenha sofrido qualquer tipo de lesão que tenha dado origem a problemas periodontais em sua dentição superior e inferior, a ponto de ter que extrair todos os seus dentes e substituí-los por prótese dentária. Conclui-se pois que a realização de procedimento cirúrgico-odontológico, ainda que invasivo, não teve como única motivação a imperiosa necessidade de reposição dentária. Por certo que as medidas preventivas de manutenção da saúde bucal e os tratamentos odontológicos integram a assistência à saúde que é um dever do Estado.

4 Em hipóteses de emergência e/ou urgência de tratamento de saúde, seja de que natureza for, comprovada a hipossuficiência financeira do cidadão certamente está o ente federativo, em qualquer esfera, obrigado a oferecer gratuitamente o tratamento indicado, seja na rede pública ou mesmo, em situações excepcionais, na rede privada. No entanto deve restar demonstrada a causa clínica que justifica a indicação do tratamento, o que, in casu, não ocorreu. Na forma do art. 273, caput e inc. I, CPC, para a concessão da tutela antecipada exige-se a presença de prova inequívoca da verossimilhança das alegações, e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Registre-se que não há nos autos prescrição médica atestando que o tratamento ortodôntico pretendido pelo ora agravado possua caráter de urgência/emergência, sob pena de sofrer aquele dano irreparável ou de difícil reparação. Em situação congênere, veja-se o entendimento jurisprudencial desta Corte, verbis: AGRAVO DE INSTRUMENTO 1ª Ementa DES. ELISABETE FILIZZOLA - Julgamento: 01/03/ SEGUNDA CAMARA CIVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO ORTODÔNTICO. NÃO COMPROVAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DO TRATAMENTO E DA HIPOSSUFICIÊNCIA DA AUTORA AO SEU CUSTEIO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 273 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. SÚMULA 59 DO TJERJ. Ainda que existente nos autos atestado indicando o tratamento ortodôntico à Autora, não há demonstração de que a colocação do aparelho odontológico tenha caráter essencial e, conquanto seja inquestionável o dever de fornecimento gratuito pelos entes federativos de medicamentos aos economicamente hipossuficientes, observa-se que, no caso dos autos, ausentes elementos suficientes a afirmar a impossibilidade de pagamento do tratamento Autora/Agravante. Não pode o Poder Judiciário presumir a imprescindibilidade do tratamento odontológico requerido, bem como a hipossuficiência da demandante em custeá-lo, impondo à Edilidade a responsabilidade pelo seu custeio, sob risco de prejuízo injustificável ao erário. No juízo de cognição sumária, atenta-se que com o suporte probatório existente, não restaram demonstrados os requisitos fumus boni iuris e periculum in mora, necessários à concessão da tutela pretendida. Ademais, consoante entendimento já consolidado em nosso E. Tribunal de Justiça "somente se reforma a decisão concessiva ou não da antecipação de tutela, se teratológica, contrária à Lei ou à prova dos autos". RECURSO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO, NA FORMA DO ART. 557, CAPUT, DO CPC.

5 Isso posto, voto pelo PROVIMENTO do agravo para cassar a tutela antecipada concedida pelo juízo de 1º grau. Relator