O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO E OS ADVOGADOS
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- Kléber Clementino Freire
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1 ORDEM DOS ADVOGADOS DELEGAÇÃO DE BARCELOS DIA DO ADVOGADO 19 DE MAIO DE O ESTADO DE DIREITO DEMOCRÁTICO E OS ADVOGADOS CONTRIBUTOS PARA UMA REFLEXÃO Textos: ARTIGO 1º CRP República Portuguesa Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
2 ARTIGO 2º CRP Estado de direito democrático A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa. ARTIGO 3º CRP Soberania e legalidade 1.A soberania, una e indivisível, reside no povo, que a exerce segundo as formas previstas na Constituição. 2.O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática. 3.A validade das leis e dos demais actos do Estado, das regiões autónomas, do poder local e de quaisquer outras entidades públicas depende da sua conformidade com a Constituição.
3 ARTIGO 20º CRP ACESSO AO DIREITO E TUTELA JURISDICIONAL EFECTIVA 1.A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos. 2.Todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade. 3.A lei define a assegura a adequada protecção do segredo de justiça. 4.Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo. 5.Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.
4 ARTIGO 12º CRP Princípio da Universalidade 1.Todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição. ARTIGO 13º CRP Princípio da Igualdade 1.Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei. 2.Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
5 ARTIGO 16º CRP Âmbito e sentido dos direitos fundamentais 1.Os direitos fundamentais consagrados na Constituição não excluem outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional. 2.Os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem. ARTIGO 202º CRP Função Jurisdicional 1.Os tribunais são os orgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo. 2.Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados. 3...
6 ARTIGO 203º CRP Independência Os tribunais são independentes e apenas estão sujeitos à lei. ARTIGO 204 CRP Apreciação da inconstitucionalidade Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados. ARTIGO 208º CRP Patrocínio forense A lei assegura aos advogados as imunidades necessárias aos exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial á administração da justiça.
7 Reflexão: O Estado é um Estado de direito democrático. Este conceito chave da CRP é complexo e tem duas componentes, ou seja, a componente do Estado de Direito e a componente do Estado Democrático e não podem ser separadas uma da outra. O Estado de Direito é democrático e só sendo-o é que é Estado de Direito; o Estado Democrático é estado de direito e só sendo-o é que é democrático. Ao fundir num único conceito essas duas componentes a CRP arredou, ao mesmo tempo, toda e qualquer concepção que permitisse um entendimento do Estado de Direito como obstáculo ao desenvolvimento democrático, ou uma consideração do estado democrático que fosse alheio a um corpo de regras sobre a formação e exercício do poder e sobre a posição subjectiva dos cidadãos perante os poderes públicos.
8 A qualificação democrática obriga a ler o Estado de direito no quadro do princípio democrático concretamente configurado na CRP, apontado como está um horizonte de democracia material, consubstanciada na realização da democracia económica, social e cultural ( art. 2º in fine ), na efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais, mediante, entre outras coisas, a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais ( vide art. 9º d) ). O princípio do Estado de direito democrático, mais do que constitutivo de preceitos jurídicos, é sobretudo conglobador e integrador de um amplo conjunto de regras e princípios dispersos pelo texto constitucional, que densificam a ideia da sujeição do poder a princípios e regras jurídicas, garantindo aos cidadãos liberdade, igualdade e segurança. Ele abrange, entre outros, o: - princípio da constitucionalidade art. 3º - e a fiscalização da constitucionalidade art. 277º e ss - a protecção dos direitos, liberdade e garantias art.º 24 e ss
9 - e respectivo regime de protecção art. 18º - o princípio da legalidade da administração art. 266º - o direito à justiça administrativa art. 268º - a responsabilidade do Estado pelos danos causados aos cidadãos - art. 22º - a reserva da função jurisdicional para os Tribunais art a independência dos Juizes art. 218º - a garantia de acesso aos Tribunais art. 20º - a reserva da lei em matéria de restrição de direitos, liberdades e garantias art. 18º -3 - a reserva de criação de impostos art. 106º - as limitações à admissão de leis retroactivas, em espacial em matéria criminal art. 18º - 3 e 29º - a limitação das medidas de polícia art. 272º a liberdade do trabalho Acresce que uma outra vertente do Estado de direito democrático é a componente democrática.
10 O Estado é um Estado Democrático porque está baseado na soberania popular e na vontade popular, sendo o poder político exercido através do sufrágio universal, igual, directo e secreto e assente na participação democrática dos cidadãos na resolução dos problemas nacionais através de variadas formas e instâncias. Estado de Direito Democrático significa, assim, que a Constituição é, directamente, a lei que rege a organização e o exercício do poder político, que o poder se forma e se exerce nos termos da Constituição, que a democracia é constitucional, que não existe democracia fora da constituição e que nenhuma vontade pode prevalecer sobre a Constituição. A vinculação da jurisdição pelo princípio da igualdade comporta três dimensões fundamentais: - igualdade de acesso dos cidadãos à jurisdição art.º igualdade dos cidadãos perante o tribunal - igualdade de aplicação do direito aos cidadãos através dos tribunais.
11 Também por isso o direito de recorrer aos Tribunais será meramente teórico se não se garantir que o direito ao recurso aos tribunais não possa ser prejudicado pela insuficiência de meios económicos. Tal tem implicação no regime das custas judiciais, no acesso ao patrocínio judiciário e à informação jurídica art.º 20. O papel do Advogado foi, é e será, assim, fundamental. Desde sempre os Advogados, enquanto cidadãos e representantes dos cidadãos, participaram na construção e aprofundamento do Estado de Direito Democrático e querem, obviamente, continuar a ter um papel activo. A sociedade em geral está atenta aos comportamentos dos Advogados e à reacção da Ordem dos Advogados.
12 O Advogado pode e deve encontrar sempre o meio de defender os interesses em conflito, em especial devendo pôr a sua inteligência ao serviço do direito, logo ao serviço do Povo. Acresce que, A Ordem dos Advogados é uma associação pública representativa dos licenciados em direito que, em conformidade com os Estatutos e demais disposições legais aplicáveis, exercem profissionalmente a advocacia (art. 1º, n.º 1 EOA ). A Ordem dos Advogados é independente dos orgãos do Estado, sendo livre e autónoma nas suas regras ( art. 1º, n.º 2 EOA ). Entre as atribuições da Ordem dos Advogados destacamos art.º 3 EOA: a) Defender o Estado de direito e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e colaborar na administração da justiça; b) Assegurar o acesso ao direito, nos termos da Constituição;
13 c)... d)... e) Defender os interesses, direitos, prerrogativas e imunidades dos seus membros; f)... g) Exercer, em exclusivo, jurisdição disciplinar sobre os advogados e advogados estagiários; h)... i) Contribuir para o desenvolvimento da cultura jurídica e aperfeiçoamento da elaboração do direito; j) Ser ouvida sobre os projectos de diplomas legislativos que interessam ao exercício da advocacia e ao patrocínio judiciário em geral e propor as alterações legislativas que se entendam convenientes; E, nos termos do art. 64º EOA gozam os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor de liberdade de exercício da profissão, não podendo ser impedidos, por qualquer autoridade pública ou privada, de praticar actos próprios da advocacia.
14 Aliás, nos termos do art. 67º EOA os Magistrados, Agentes de Autoridade e Funcionários Públicos devem assegurar aos advogados, aquando do exercício da sua profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas para o cabal desempenho do mandato. O preciosismo legislativo chega ao ponto de ser estatuído que nas audiências de julgamento os advogados dispõem de bancada própria e podem falar sentados. n.º 2 do art. 67 EOA. São muitas as normas que estabelecem regras para a imposição de selos, arrolamentos e buscas em escritório de advogados, sobre a apreensão de documentos, direito de reclamação, de comunicação pessoal e reservada com os patrocinados, mesmo os presos e detidos em estabelecimento civil e militar, direito de protesto, informação, exame de processos e pedidos de certidões ( arts. 70º a 75º EOA ).
15 Mas, sobretudo, convirá lembrar algumas das normas relativas à deontologia e ética profissionais: Desde logo o advogado é imprescindível à administração da justiça e, também por isso, é-lhe exigível um comportamento público e profissional adequados à dignidade e responsabilidade da função que exerce artigo 83º EOA. E, o advogado, no exercício da profissão, mantém sempre em quaisquer circunstâncias, a sua independência, devendo agir livre de qualquer pressão, abstendo-se de negligenciar a deontologia profissional no intuito de agradar ao seu cliente, aos colegas, ao tribunal ou a terceiros art. 84º EOA. Finalmente, o advogado está obrigado a defender os direitos, liberdades e garantias, a pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e instituições jurídicas nº. 1 do art.º 85 EOA.
16 Qual o papel do Advogado no Estado de Direito Democrático? Nada melhor para terminar e deixar a melhor reflexão para esta complexa questão, do que uma citação das declarações do então Bastonário da Ordem dos Advogados, Dr. António Pires de Lima, aquando do V Congresso dos Advogados Portugueses ( 17 a 20 de Maio de 2000 ): A Ordem dos Advogados empenha-se na defesa dos direitos. Com naturalidade, sem alardes, com eficácia ( ) Há Estado de Direito quando se assegura o direito do cidadão à Justiça. Mas esse é um mero enunciado formal quando a Justiça se realiza atempadamente ou quando se permite que a prescrição a aniquila quando se torna sistemática a impunidade dos funcionários e agentes do Estado e dos detentores do poder económico ( )
17 Há legalidade quando se estende a faculdade de investigação penal a mais entidades. Mas não há Estado de Direito quando se atribui a investigação a instituições que, por actos públicos revelam não saber suportar os critérios de Justiça, nem manifestam consideração e respeito pelos que têm de decidir ( ) A Ordem defende o Estado de Direito. E defende a legalidade. Mas esta assenta na autoridade. E a autoridade no bom senso. Não é a autoridade que gera bom senso. É o bom senso que pode gerar a autoridade. È do bom senso que depende a existência de Estado de Direito ( )". Barcelos, 19 de Maio de 2010 Horácio Barra Advogado
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