JESUS, PALAVRA ENCARNADA, PALAVRA ANUNCIADA

Transcrição

1 JESUS, PALAVRA ENCARNADA, PALAVRA ANUNCIADA

2 COMO JEUS ENCARNAVA E ANUNCIAVA A PALAVRA DE DEUS Introdução Animação Bíblica da Pastoral está ligada à prática de Jesus como Pastor, ou seja, com o jeito de Jesus animar biblicamente sua prática pastoral. Na época de Jesus não havia Bíblia em casa. Só havia uma na sinagoga. Era no ambiente orante comunitário da casa e da sinagoga que a Palavra era ouvida, meditada, anunciada e praticada.

3 1. COMO JESUS ENCARNAVA A PALAVRA DE DEUS NA SUA VIDA

4 1.1. Em Jesus a Palavra se fez carne e habitou entre nós (Jo 1,14). a) Jesus assumiu os condicionamentos da sua época: família, cultura, língua...: filho do carpinteiro (Mt 13,55) Foi provado como nós, em tudo, menos no pecado (Hb 4,15) sendo de condição humana, esvaziou-se a si mesmo... (Fl 2,6-7) Mesmo sendo Filho de Deus, teve que aprender pelo sofrimento o que vem a ser a obediência (Hb 5,8).

5 b) Jesus deixou-se moldar pela Palavra: Eu faço sempre o que o Pai me manda fazer (Jo 12,50) O meu alimento é fazer a vontade do Pai (Jo 4,34); Quem me vê, vê o Pai (Jo 14,9).

6 1.2. As etapas do processo da encarnação da Palavra de Deus em Jesus Os três ambientes da sua formação a) Em casa na família: a transmissão da fé vinha do ambiente familiar Evoco a lembrança da fé sem hipocrisia que há em ti (Timóteo), a mesma que habitou primeiramente em tua avó Lóide e em tua mãe Eunice e que, estou convencido, reside também em ti. (2Tm 1,5) Desde a infância você conhece as Sagradas Escrituras; elas têm o poder de comunicar a sabedoria que conduz à salvação pela fé em Jesus Cristo. (2Tm 3,15).

7 b) Na sinagoga em comunidade. Nela se faziam duas leituras: da Lei e dos profetas (At 13,15). Jesus costumava participar da celebração da Palavra na sinagoga (Lc 4,16).

8 c) No templo nas romarias com o povo. O ano litúrgico era marcado por três grandes festas: Páscoa, Pentecostes e Tendas, das quais Jesus participou desde os doze anos (Lc 2,41-50). Era um ritmo comunitário orante: diário, semanal e anual.

9 1.3. O contexto mais amplo do ambiente em que Jesus se formou a) As propostas pedagógicas da época de Jesus Os rabinos eram os grandes educadores, que se formavam na Escola dos Escribas em Jerusalém (At 22,3) e depois atuavam nas aldeias. Ocupavam dois espaços: o culto na sinagoga e na escola, que funcionava junto à sinagoga. Seu dia era dividido em três partes: oito horas para o estudo, oito horas para o trabalho e oito horas para o descanso.

10 b) Os primeiros passos de Jesus na sua formação Até os doze anos deve ter frequentado a escola sinagogal, já que sabia ler (Lc 4,16) e escrever (Jo 8,6). Com doze anos, passou pelo ritual do Bar Mitzvah (Lc 2,41-46) Dos doze aos trinta anos sabemos somente que Jesus crescia em sabedoria, tamanho e graça diante de Deus e dos homens. (Lc 2,52).

11 Aos trinta anos fez sua opção pelo movimento popular de sua época, marcado pela mensagem profética de João Batista (Mc 1,2-11) Depois da morte de João Batista, iniciou sua vida pública com uma proposta: O tempo já se cumpriu: o Reino de Deus está próximo; mudem de mentalidade e acreditem na Boa Nova. (Mc 1,15).

12 c) A escola de Jesus Jesus não frequentou a Escola dos Escribas (Jo 7,15), como Paulo (At 22,3). Sua escola foi uma pequena aldeia, Nazaré. A vida em casa, a escuta da Bíblia na sinagoga, a Tradição transmitida pelos escribas, a convivência com o povo, o trabalho e a oração. Tinha uma profunda intimidade com o Deus, seu Pai (Lc 6,12).

13 1.4. Instruído pela meditação da Palavra, Jesus assume a missão do Servo O programa de sua missão de Servo vem do profeta Isaías (Lc 4,18-19 e Is 61,1-2). Os cânticos do servo de Isaías (42 53) foram sua inspiração. O ensino oficial esperava um Messias glorioso...

14 2. COMO JESUS ANUNCIAVA A PALAVRA DE DEUS AO POVO

15 2.1. Um novo modo de anunciar a Boa Nova de Deus Não quis ensinar as pessoas a praticar a lei, nem obedecer as autoridades constituídas, nem uma relação professoraluno... Quis ser amigo e ajudar as pessoas a crescerem no relacionamento fraterno e com Deus.

16 a) Refazer o relacionamento humano na base No antigo Israel, a Casa (clã) era a base da convivência social. Garantia a terra, a proteção, os relacionamentos, as tradições... Defender a Casa era defender a Aliança entre Deus e o povo. Na época de Jesus, a Casa estava muito enfraquecida: pela política dos romanos e de Herodes (impostos...); pela prática religiosa centrada nos sacrifícios...

17 b) Visitar o povo nas suas casas e recuperar a dimensão sagrada da festa Enquanto a religião oficial insistia no espaço sagrado do Templo, Jesus recupera a dimensão caseira da fé.

18 Entrou na casa... de Pedro (Mt 8,14), de Mateus (Mt 9,10), de Jairo (Mt 9,23), de Simão o fariseu (Lc 7,36), de Simão o leproso (Mc 14,3), de Zaqueu (Lc 19,5), parava na casa de Marta, Maria e Lázaro (Jo11,3.5.45), enviou os discípulos para a missão de entrar nas casas e levar a paz (Mt 10,12-14).

19 Nas casas ele almoçava, jantava com o povo... a ponto de ser taxado de comilão e beberrão (Mt 11,19). Jesus recupera as quatro bases da vida comunitária: hospitalidade, partilha, comunhão de mesa e acolhida aos excluídos (Lc 10,1-9).

20 c) Cuidar dos doentes e acolher os excluídos O primeiro trabalho pastoral de Jesus foi cuidar dos doentes (Mc 1,32). A doença era considerada castigo de Deus e excluía da convivência social.

21 d) Ir ao encontro das pessoas e propor um caminho A pedagogia de Jesus é diferente da dos escribas de sua época. No lugar de encerrar-se numa sinagoga ou numa escola, torna-se um pregador ambulante Sua atuação acontece na diversidade de lugares: na sinagoga (Mc 1,21), nas casas de amigos (Mc 2,1.15), no caminho (Mc 2,23), ao longo do mar (Mc 4,1), no deserto (Mc 6,32-34), na montanha (Mt 5,1), nas praças das aldeias (Mc 6,55-56), no templo (Mc 14,49).

22 A proposta pedagógica de Jesus é a do discipulado. Seu exemplo de vida é pedagógico: Venham a mim todos vocês que estão cansados... aprendam de mim... (Mt 11,28-30).

23 e) Criar comunidade e reconciliar as pessoas As pessoas que seguem Jesus têm diferentes origens: Pescadores (Mc 1,16-20), publicanos (Mt 9,9), zelotas (Mt 10,4)... Mateus e Simão, inimigos ferrenhos, agora caminhando juntos, na mesma opção.

24 f) Superar as barreiras de gênero, religião, raça e classe Jesus conversa com Nicodemos (Jo 3,1), acolhe o pedido do oficial romano (Mt 8,5), acolhe a mulher cananeia (Mc 7,25-29), entra na casa dos cobradores de impostos (Mc 2,15-16), conversa com uma mulher samaritana (Jo 4,7), aceita mulheres como discípulas (Mc 15,41; Lc 8,2-3).

25 2.2 O uso que Jesus faz da Bíblia para anunciar a Boa Nova de Deus a) Jesus usa a Bíblia em todos os níveis da atividade Pastoral: FAMILIARIDADE Desde Abraão, Isaque e Jacó (Mc 12,26), a história de Moisés na sarça ardente (Mc 12,26), as prescrições da Lei sobre a pureza legal (Mc 1,44; 7,10) e sobre o divórcio (Mc 10,3), até Jonas (Mt 12,39-41), a rainha do Sul (Mt 12,42), Salomão (Lc 11,31), Elias, Eliseu e as histórias de Naamã o Sírio e da viúva de Sarepta (Lc 4,25-27), e tantos outros.

26 Ao jovem rico ele lembra os mandamentos da lei de Deus (Mc 10,19). Na expulsão dos vendedores do templo, ele cita de memória textos de Jeremias: Vocês fizeram do templo uma toca de ladrões (Mc 11,17 e Jr 7,11), e de Isaías: Minha casa será chamada casa de oração para todos os povos (Mc 1,17 e Is 56,7). Cita Oséias: Quero misericórdia e não sacrifício (Mt 9,13; 12,7 e Os 6,6). Cita o primeiro mandamento do livro do Deuteronômio (Mc 12,29-30 e Dt 6,4-5) e a lei do amor ao próximo do livro do Levítico (Mc 12,31 e Lv 19,18), etc. etc...

27 Os salmos eram o livro de canto que todos sabiam de memória. O Sermão da Montanha evoca diversos salmos: Felizes os mansos, porque herdarão a terra (Mt 5,4; Sl 37,11); Felizes os que choram porque serão consolados (Mt 5,5; Sl 126,5); Felizes os puros de coração, porque verão a Deus (Mt 5,8; Sl 24,3-4); Na cruz, ele reza dois salmos: Meu Deus! Meu Deus! Por que me abandonaste? (Mc 15,34; Sl 22,1) e Em tuas mãos entrego o meu espírito (Lc 23,46; Sl 31,6).

28 O Pai Nosso retoma os grandes ensinamentos do Antigo Testamento: santificação do Nome, vinda do Reino, realização da vontade expressa na lei, o maná ou o pão de cada dia, perdão das dívidas, resistência contra as tentações (Mt 6,9-13).

29 b) O uso que Jesus faz da Bíblia incomoda os conservadores: LIBERDADE Jesus critica fortemente os doutores que insistem na observância da letra da lei e que, por isso mesmo, já não percebem o objetivo da lei: Ai de vocês, doutores da lei e fariseus hipócritas! Vocês pagam o dízimo da hortelã, da erva-doce e do cominho, e deixam de lado os ensinamentos mais importantes da Lei, como a justiça, a misericórdia e a fidelidade. Vocês deveriam praticar isso, sem deixar aquilo. Guias cegos! Vocês coam um mosquito, mas engolem um camelo (Mt 23,23-24).

30 Jesus sabe usar o segundo livro de Deus que é a Bíblia para ajudar o povo a entender o primeiro livro de Deus que é a vida. c) Na maneira de usar a Bíblia Jesus busca o objetivo da lei: FIDELIDADE Na longa instrução aos discípulos no evangelho de Marcos (Mc 8,27 a 10,45), Jesus os ajuda a entender o verdadeiro sentido da profecia de Isaías sobre o Servo de Javé.

31 Ele cita três vezes aquelas palavras da profecia que falam do sofrimento e da morte do Servo e as aplica a si mesmo (Mc 8,31; 9.31; 10,33-34). Mas os discípulos não deram conta de entender a interpretação de Jesus (Mc 8,32-33; 9,32). Em vez de pensar na cruz, pensavam na sua própria promoção. Jesus tentou ajudá-los (Mc 10,35-45), mas nem sempre o conseguia. A catequese tradicionalista os impedia de perceber a novidade trazida por Jesus.

32 2.3. A prática pedagógica de Jesus. A prática pastoral de Jesus tem um objetivo: o seguimento, que se dá por um determinado tipo de relacionamento: mestre-discípulo. É diferente do relacionamento professor-aluno. Seguindo o mestre, o discípulo aprende convivendo com ele.

33 a) Uma pedagogia que parte da realidade. Jesus convida as pessoas à reflexão a partir das coisas ou dos fatos corriqueiros: salgar a comida (Mt 5,13), acender uma lâmpada (Mt 5,14), camponeses semeando (Mt 13,4), trabalhadores desempregados (Mt 20,7)... b) Uma pedagogia participativa. Ao optar pelo ensinamento através de parábolas, Jesus adota uma pastoral de participação do ouvinte.

34 A palavra parábola vem do grego e significa comparação. Na verdade, a parábola tenta traduzir o hebraico mashal. Um mashal é mais do que uma comparação. É uma sentença sapiencial, uma frase, um dito, um provérbio, enfim, o alicerce da Sabedoria que define o pensamento próprio do povo de Israel (cf. Sl 78,1-8). O mashal só se completa com a reação e a participação do ouvinte (Lc 10,36-37).

35 c) Uma pedagogia libertadora. Jesus é humano, muito humano, tão humano como só Deus pode ser humano! É amigo (Jo 15,15), atencioso com o povo cansado (Mc 6,31), misericordioso, manso e humilde (Mt 11,28)...

36 2.4 O objetivo do uso da Bíblia na Pastoral: revelar a presença de Deus na vida 1º Livro: a criação, a natureza, a vida, o mundo, o cosmos, os fatos, a história... 2º Livro: a Bíblia

37 2.5. A Mística: só pode trabalhar com a Palavra quem se deixa trabalhar pela Palavra O segredo escondido da vida de Jesus era o Pai. Jesus vivia unido a Ele através da oração. É na oração que ele assimilava e encarnava a Palavra em sua vida. A palavra que Jesus anunciava era a experiência que ele mesmo tinha da palavra.

38 3. CONCLUSÕES PRÁTICAS PARA A ANIMAÇÃO BÍBLICA DA PASTORAL

39 - Dez maneiras de Jesus iluminar e animar com a Bíblia seus trabalhos pastorais: a) Meditação constante da Palavra de Deus: Só pode trabalhar com a Palavra quem se deixa trabalhar pela Palavra. Jesus se inspirava na missão do Servo descrita na livro de Isaías. Os primeiros cristãos imitavam Jesus (At 17,11). b) Ambiente comunitário: Assim também viviam os primeiros cristãos (At 2,42-47). c) Ambiente orante e celebrativo: aos sábados na sinagoga. Os primeiros cristãos (At 4,23-31)

40 d) Usar a Bíblia para interpretar a vida: usava o segundo livro para iluminar o primeiro; e) Fomentar a admiração diante da natureza: Foi na contemplação da natureza que Jesus descobria os apelos da Palavra viva de Deus (Mt 5,45); f) O coração de toda ação pastoral de Jesus: obediência ao sopro do Espírito; g) Evitar o fundamentalismo pela leitura crítica do texto;

41 h) Itinerância e novas formas de pastoral: não se perder nas estruturas existentes. Jesus não se limitou ao espaço da sinagoga...; i) A prática da partilha (At 2,44-45; Lc 24,35); j) Pastoral da inclusão. Acolher as pessoas descartáveis (Dap 65).