Sete-de-Ouros - Major Saulo - João Manico -
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- Tomás Terra Prada
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Transcrição
1 João Guimarães Rosa
2 Sete-de-Ouros - É um burrinho pedrês, isto é, de pintas pretas e brancas. Animal aposentado,idoso, miúdo e resignado, beiço inferior caído e já fora tão bom, como outro não existiu e nem pode haver igual. Outros nomes tivera ao longo de anos e amos: Brinquinho, Rolete, Chico-Chato e Capricho. Major Saulo - corpulento, quase obeso, olhos verdes. Só com o olhar mandava um boi bravo se ir de castigo. Estava sempre rindo: riso grosso, quando irado; riso fino, quando alegre; riso mudo, de normal. Não sabia ler nem escrever, mas cada ano ia ganhando mais dinheiro, comprando mais gado e terras. João Manico - pode-se inferir que esse personagem-narrador é o alterego do autor, ou seja, é nele que Guimarães deposita suas experiências. Vaqueiro sensato e cauteloso, de estatura pequena, que montou o burrinho Sete-de-Ouros na ida, mesmo contra sua vontade. Na volta, trocou de montaria. Na hora de entrar na água, refugou porque ouvia o pio do pássaro de mau agouro e, por isso, resolveu respeitá-lo, contendo o poldro pampa e foi assim que este escapou da morte.
3 Francolim - espécie de secretário do Major Saulo, encarregado de pôr ordem nos vaqueiros. Obedece cegamente às ordens do Major. Foi salvo, na noite da enchente, pelo burrinho Sete-de-Ouros, agarrando-se ao rabo do animal. Este havia menosprezado o animal caracterizando-o de velho e cego. Raymundão - vaqueiro de confiança do Major Saulo. Enquanto tocam a boiada, vai contando a história do zebu Calundu. Zé Grande - vai à frente da boiada, tocando o berrante. Silvino - vaqueiro que perdeu a namorada para Badu e planejava matar o rival na volta, depois de deixarem a boiada no arraial. Badu vaqueiro que se engraçou com a namorada de Silvino. Bebe além da conta e é quem monta o burrinho pedrês, o animal que fora menosprezado pelos outros companheiros.
4 A trama desse conto, como nas demais narrativas de Guimarães Rosa, é relativamente simples. Publicado pela primeira vez em 1946, O burrinho pedrês é uma história sugerida por um acontecimento real, passado no interior de Minas Gerais, envolvendo um grupo de vaqueiros. No conto, a voz do narrador principal é entrecortada pela voz dos personagensnarradores. Ao mesmo tempo que o narrador principal relata um episódio da vida do burrinho e as peripécias do grupo de boia deiros naquele dia fatídico, ele dá voz aos próprios boiadeiros, permitindo que estes desfiem suas histórias e que, assim, transformem-se também em narradores.
5 A história do burrinho Sete-de-Ouros contada pelo narrador principal transcorreu em apenas um dia da vida do personagem, das seis da manhã à meia-noite, intervalo durante o qual um grupo de boiadeiros conduziu uma boiada da Fazenda da Tampa até a estação de trem do vilarejo de Arraial, tendo como obstáculo o córrego da Fome, um afluente do Rio das Velhas. Esse dia seria normal caso a tropa de vaqueiros voltasse ilesa à fazenda. Todavia, o grupo, que na ida atravessara o rio sem problemas, foi surpreendido na volta por uma enchente. A tragédia aniquilou oito boiadeiros e aconteceu porque o grupo confiou na experiência do burrinho que lhe serviu de guia: como este resolveu atravessar o rio, os boiadeiros também decidiram fazer a travessia.
6 Desde esse primeiro conto, estão presentes os elementos fundamentais para compreendermos os contos de Sagarana. O nome do burrinho, Sete-de- Ouros, é recoberto pela magia de um número místico (sete) e pela força simbólica do ouro. A travessia, a superação de obstáculos por ocultos caminhos é uma imagem frequente em Guimarães Rosa, como também a presença de forças mágicas, da natureza, atuando sobre o mundo e mostrando as possibilidades de os fracos se tornarem fortes.
7 Neste conto, o burro não é burro, ao contrário, foi este animal que, apesar de idoso e desacreditado, salvou vidas. Não nadando contra a correnteza, personificando a cautela, a prudência e a sapiência adquirida com a velhice, o burro imitou qualidades humana.
8 Seja pela fórmula linguística caracterizadora da narrativa elementar da fábula, da lenda (Era um burrinho...), tempo e modos verbais que, de imediato, tiram à narrativa o caráter de coisa datada, para projetarem na esfera atemporal do universo de ficção, seja pela mescla de precisão e imprecisão documental no registro do espaço (vindo de Passa-Tempo, Conceição do Serro, ou não sei onde no sertão), seja pela dimensão antropomórfica (forma humana) que é dada à personagem central ("burrinho-gente ) e que situa a narrativa na fronteira entre o real e o mágico, seja pela funcionalidade das cantigas inseridas no fluxo narrativo, tudo isso e muito mais nos revela, no universo da palavra rosiana, a presença do "homo ludens" (homem lúdico), descompromissado com as estruturas convencionais do pensamento lógico nas obras do autor, Guimarães Rosa.
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