Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro GABINETE DO DESEMBARGADOR GILMAR AUGUSTO TEIXEIRA OITAVA CÂMARA CRIMINAL

Transcrição

1 Apelante Apelado : ALCIMAR DE MELO DA SILVA : MINISTERIO PUBLICO APELAÇÃO. ROUBO MAJORADO (ART. 157, 2º, I DO CÓDIGO PENAL). RECURSO QUE VISA A MITIGAÇÃO DAS PENAS-BASE, O RECONHECIMENTO DE ATENUANTE DO ART. 66 DO CP, AFASTAMENTO DA CAUSA DE AUMENTO REFERENTE AO EMPREGO DE ARMA, ABRANDAMENTO DO REGIME, E LIVRAMENTO CONDICIONAL. O apelante pediu à vítima, mototaxista, que o levasse a determinado local. Ao chegar ao destino, o apelado anunciou o roubo, pronunciando a expressão perdeu, ao mesmo tempo em que exibiu a arma para a vítima, logrando o roubador subtrair a motocicleta e partir em fuga. Colegas do mototaxista, sabedores do ocorrido, a este relataram ter visto um indivíduo circulando pelos arredores com a moto, e comunicaram aos policiais, que efetuaram a prisão do ora apelado, o qual já havia se desfeito da motocicleta. Mais tarde, a vítima foi chamada à delegacia, onde reconheceu o roubador. A materialidade e a autoria do delito restaram comprovadas diante 1

2 das declarações da vítima em juízo e em sede distrital, dos termos de reconhecimento, e dos depoimentos do policial que efetuou a prisão, sem insurgência da defesa. Revendo a dosimetria, observa-se que o magistrado de piso utilizou-se de anotações da FAC sem trânsito em julgado para elevar as penas básicas, orientação diametralmente oposta à Sumula nº 444, do STJ. Na segunda etapa, há incidência da atenuante genérica constante do art. 66 do CP, pois se constata, através do laudo do incidente de dependência toxicológica o retardo mental leve, do qual o apelante é portador. Não obstante, as penas devem estagnar, pois não há como reduzilas aquém do mínimo legal, por impositivo da Súmula nº 231 do STJ. Na ultima fase, deve incidir a causa de aumento referente ao emprego de arma, pois é entendimento desta relatoria que a apreensão da arma de fogo e respectiva perícia são prescindíveis quando for possível realizar a prova por outros meios. Neste sentido, decisões do Pleno e Turmas do STF, bem como do STJ. Foi mantido o regime fechado, dado o emprego de arma de fogo, que poderia lesionar inclusive a 2

3 terceiros. Quanto ao pedido de livramento condicional, melhor dirá o juízo da execução. Penas mitigadas, mas mantido o regime. RECURSO CONHECIDO e PARCIALMENTE PROVIDO, nos termos do voto do relator. Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Criminal nº , onde figuram as partes preambularmente epigrafadas, A C O R D A M, os Desembargadores que integram a Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para reduzir as penas ao patamar de 05(cinco) anos e 04(quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 13(treze) dias-multa, estes no valor individual de 1/30 do salário-mínimo vigente, corrigidos até a data do efetivo pagamento. V O T O Trata-se de imputação crime de roubo majorado, em que o apelante pediu à vítima, mototaxista, que o levasse a 3

4 determinado local. Ao chegar ao destino, o apelado anunciou o roubo, pronunciando a expressão perdeu, ao mesmo tempo em que exibiu a arma para a vítima, logrando o roubador subtrair a motocicleta e partir em fuga. Colegas do mototaxista, sabedores do ocorrido, a este relataram ter visto um indivíduo circulando pelos arredores com a moto, e comunicaram aos policiais, que efetuaram a prisão do ora apelado, que já havia se desfeito da motocicleta. Mais tarde, a vítima foi chamada à delegacia, onde reconheceu o roubador. A materialidade e a autoria do delito restaram comprovadas diante das declarações da vítima em juízo (fls. 66) e em sede distrital (fls. 07), dos termos de reconhecimento (fls. 08 e 65), e dos depoimentos do policial que efetuou a prisão (fls. 09 e 67), sem insurgência da defesa. O recurso defensivo visa exclusivamente a reavaliação dosimétrica da pena, com a mitigação das penas-base, o reconhecimento de atenuante prevista no art. 66 do Código Penal, o afastamento da causa de aumento referente ao emprego de arma, o abrandamento do regime, e o livramento condicional. Analisemos, pois. 4

5 Observa-se que o magistrado de piso utilizou-se de anotações constantes da FAC de fls. 50/55 (e-doc. 60) sem trânsito em julgado para elevar as penas básicas, orientação diametralmente oposta àquela dada pelo Superior Tribunal de Justiça, através do verbete sumular nº 444, in verbis: Súmula n. 444, STJ: É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a penabase Assim, devem as penas inicias ser fixadas no mínimo, em 4 anos de reclusão e 10 dias-multa. Na segunda fase, assiste ainda razão à defesa quanto à incidência da atenuante genérica constante do art. 66 do Código Penal, na medida em que se constata, através do laudo pericial constante do incidente de incidência toxicológica, a fls. 18/22 do apenso, o retardo mental leve, do qual o apelante é portador. Não obstante, as penas devem estagnar em 4 anos e 10 dias-multa, pois não há como reduzi-las aquém do mínimo legal, por impositivo da súmula nº 231 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: Sumula 231, STJ: A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal. 5

6 Na terceira fase, pleiteia a defesa seja afastada a causa de aumento referente ao emprego de arma, ao argumento de que, para tal majoração, seria indispensável a realização de perícia na arma, ou, pelo menos, a demonstração por outros meios de prova, de sua capacidade vulnerante. Entretanto, tal pleito não há que ser acatado, pois é entendimento desta relatoria que a apreensão da arma de fogo e respectiva perícia são prescindíveis quando for possível realizar a prova por outros meios. Na hipótese, temos as declarações da vítima, a qual relatou que o apelante, ao chegar ao destino e descer do mototaxi, virou para aquela e anunciou o assalto com a expressão perdeu, ao mesmo tempo em que exibiu a arma de fogo. Destaque-se, inclusive, que a vítima pôde descrever a arma apontada pelo apelante como uma 40 cromada, conforme se vê a cerca de 1 35 do arquivo de mídia audiovisual. O Pleno do Supremo Tribunal Federal já decidiu, em fevereiro de 2009, ser prescindível a apreensão da arma e a respectiva perícia, se o seu efetivo uso puder ser comprovado por outros meios: 6

7 ROUBO QUALIFICADO PELO EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APREENSÃO E PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DE SEU POTENCIAL OFENSIVO. DESNECESSIDADE. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. ORDEM DENEGADA. I - Não se mostra necessária a apreensão e perícia da arma de fogo empregada no roubo para comprovar o seu potencial lesivo, visto que tal qualidade integra a própria natureza do artefato. II - Lesividade do instrumento que se encontra in re ipsa. III - A qualificadora do art. 157, 2º, I, do Código Penal, pode ser evidenciada por qualquer meio de prova, em especial pela palavra da vítima - reduzida à impossibilidade de resistência pelo agente - ou pelo depoimento de testemunha presencial. IV - Se o acusado alegar o contrário ou sustentar a ausência de potencial lesivo da arma empregada para intimidar a vítima, será dele o ônus de produzir tal prova, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. V - A arma de fogo, mesmo que não tenha o poder de disparar projéteis, pode ser empregada como instrumento contundente, apto a produzir lesões graves. VI - Hipótese que não guarda correspondência com o roubo praticado com arma de brinquedo. VII - Precedente do STF. VIII - Ordem indeferida. (STF Tribunal Pleno Rel. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI HC / RS j. em 19/02/2009). 7

8 Ambas as Turmas da Suprema Corte continuam seguindo a mesma linha de pensamento, como se observa dos seus julgados: HABEAS CORPUS. (...) ROUBO QUALIFICADO. ARMA NÃO APREENDIDA E NÃO PERICIADA. (...) O reconhecimento da causa de aumento de pena prevista no art. 157, 2º, I, do Código Penal prescinde da apreensão e da realização de perícia na arma, quando provado o seu uso no roubo por outros meios de convicção. Inteligência dos arts. 158 e 167 do Código de Processo Penal brasileiro. Precedente do Plenário (HC /RS)... (STF HC , Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 02/04/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-070 DIVULG PUBLIC ). EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. ROUBO COM EMPREGO DE ARMA IMPRÓPRIA. JULGADO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DESNECESSIDADE DE APREENSÃO DA ARMA E DE PERÍCIA PARA A COMPROVAÇÃO DA CAUSA DE AUMENTO. CIRCUNSTÂNCIA QUE PODE SER EVIDENCIADA POR OUTROS MEIOS DE PROVA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. 1. A decisão do Superior Tribunal de Justiça está em perfeita consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. 2. É desnecessária a 8

9 apreensão e a perícia da arma imprópria empregada no roubo para comprovar a qualificadora do art. 157, 2º, inc. I, do Código Penal, já que o seu potencial lesivo pode ser demonstrado por outros meios de prova, em especial pela palavra da vítima ou pelo depoimento de testemunha presencial. Precedentes. 3. Ordem denegada. (STF HC , Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 13/11/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-242 DIVULG PUBLIC ) No Superior Tribunal de Justiça, a matéria encontra-se pacificada pela 3ª Seção, prevalecendo a prescindibilidade da apreensão e perícia: CRIMINAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA NO RECURSO ESPECIAL. ROUBO. EMPREGO DE ARMA. DESNECESSIDADE DE APREENSÃO E REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. UTILIZAÇÃO DE OUTROS MEIOS DE PROVA. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE. EMBARGOS CONHECIDOS E REJEITADOS. I - Para a caracterização da majorante prevista no art. 157, 2º, inciso I, do Código Penal, prescinde-se da apreensão e realização de perícia em arma utilizada na prática do crime de roubo, se por outros meios de prova restar evidenciado o seu emprego. Precedentes do STF. II - Os depoimentos do condutor, da 9

10 vítima, das testemunhas, bem como qualquer meio de captação de imagem, por exemplo, são suficientes para comprovar a utilização de arma na prática delituosa de roubo, sendo desnecessária a apreensão e a realização de perícia para a prova do seu potencial de lesividade e incidência da majorante. III - A exigência de apreensão e perícia da arma usada na prática do roubo para qualificálo constitui exigência que não deflui da lei resultando então em exigência ilegal posto ser a arma por si só desde que demonstrado por qualquer modo a utilização dela instrumento capaz de qualificar o crime de roubo. IV - Cabe ao imputado demonstrar que a arma é desprovida de potencial lesivo, como na hipótese de utilização de arma de brinquedo, arma defeituosa ou arma incapaz de produzir lesão. V - Embargos conhecidos e rejeitados, por maioria. Deste modo, diante de prova segura da utilização de arma na ação criminosa, conforme demonstrado, cabível a incidência da causa de aumento referente ao emprego de arma. In casu, aplicada a referida majorante em sua fração mínima sobre as penas base já apuradas, eleva-se a pena final ao patamar de 5 anos e 4 meses de reclusão, e 13 dias-multa. Quanto ao regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade, deve ser mantido o fechado, por ser o mais adequado na hipótese dos autos, em razão da periculosidade 10

11 demonstrada pelo agente, as circunstâncias do crime e do elevado grau de reprochabilidade da conduta, onde foi empregada uma arma de fogo, colocando em risco não só a vida da vítima, mas também a de terceiros. Daí a necessária observância da finalidade preventiva da pena quando da fixação do regime prisional. Quanto ao pleito derradeiro de livramento condicional, melhor dirá o juízo da execução sobre os requisitos objetivos e subjetivos para sua concessão. Por tais razões, voto no sentido de CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para reduzir as penas ao patamar de 05(cinco) anos e 04(quatro) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e 13(treze) dias-multa, estes no valor individual de 1/30 do salário-mínimo vigente, corrigidos até a data do efetivo pagamento. ]Rio de Janeiro, 12 de setembro de GILMAR AUGUSTO TEIXEIRA Desembargador Relator 11