Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra Ano Lectivo 2010/2011. Unidade Curricular de BIOQUÍMICA II Mestrado Integrado em MEDICINA 1º Ano
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1 Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra Ano Lectivo 2010/2011 Unidade Curricular de BIOQUÍMICA II Mestrado Integrado em MEDICINA 1º Ano ENSINO PRÁTICO E TEORICO-PRÁTICO 7ª AULA TEÓRICO-PRÁTICA ALTERAÇÕES METABÓLICAS NO ESFORÇO FÍSICO
2 EXERCÍCIO FÍSICO O exercício físico aumenta a performance do organismo e da própria célula, uma vez que aumenta a capacidade das células em captarem a glucose. Na verdade, o exercício físico regular pode reduzir a necessidade de insulina num diabético. A duração e intensidade do exercício físico determinam o tipo de combustível que o organismo escolhe para consumir. No repouso, são utilizadas predominantemente as gorduras. Durante um exercício de curta duração, mas de alta intensidade são utilizados os hidratos de carbono. Durante o exercício de longa duração, como a maratona, os corredores consomem hidratos de carbono e gordura. Fontes de energia corporal durante o exercício: A produção de ATP, fonte energética utilizada pelas células musculares para a contracção, pode ser obtida a partir de 3 vias diferentes: - ATP creatina-fosfato, CP (metabolismo anaeróbio) - Ácido láctico (glicólise anaeróbia) - Oxigénio (metabolismo aeróbio) ATP CP Durante o repouso, o nosso organismo armazena uma quantidade muito pequena de ATP como fonte de energia de utilização rápida para a actividade física. Apesar de pequena, esta quantidade de ATP pode manter os movimentos musculares durante menos de um undo. Desta forma, o organismo armazena quantidades facilmente disponíveis de energia na forma de compostos de alta-energia como a creatina-fosfato ou fosfocreatina (CP). De facto, o nosso organismo não utiliza directamente a creatina-fosfato, mas esta regenera o ATP a partir do ADP: Creatina fosfato + ADP + H + ATP + Creatina Apesar desta reacção ocorrer na presença de oxigénio, não requer oxigénio. Desta forma o sistema ATP-CP é considerado anaeróbio. Durante os primeiros undos de uma actividade física intensa (corrida de 100 m), a creatina fosfato decresce uma vez que é utilizada para manter constantes os níveis de ATP, 1
3 que, juntamente com a CP, cede energia durante 3-15 undos. De modo a continuar o exercício físico, o organismo tem que utilizar outras fontes de ATP. Ácido láctico Uma outra forma de obtenção rápida de ATP é a formação de ácido láctico de origem glicolítica (sistema anaeróbio). É a fonte predominante de ATP durante os primeiros minutos do exercício de alta intensidade. Em situações anaeróbias, na ausência de oxigénio, o piruvato formado pela via glicolítica é utilizado para a síntese de lactato por acção da enzima lactato desidrogenase, regenerando o NAD +, que é necessário para a continuação da glicólise. Em comparação com a via aeróbia de produção de ATP (ciclo do ácido cítrico e cadeia respiratória), a produção de ATP pela glicólise (2 moléculas de ATP/molécula de glucose) ocorre a uma velocidade mais rápida. A glucose armazenada sob a forma de glicogénio é a primeira fonte de energia utilizada para a formação do ácido láctico. Assim, as células musculares podem utilizar milhares de moléculas de glucose por undo para formar ATP através da glicólise anaeróbia. No entanto, esta não é uma forma tão rápida de obtenção de energia como a degradação da CP para formar ATP. A glicólise aneróbia é uma importante via metabólica, particularmente para as fibras musculares rápidas, cedendo energia durante 40 undos a 2 minutos de actividade física. No entanto, a formação rápida de ATP causa a acumulação de ácido láctico e diminui o ph nas células musculares. Para isso contribuem não só o ácido láctico como também os compostos intermediários da via glicolítica e a degradação do ATP em ADP. A acidificação tem como consequência principal a redução da actividade das enzimas glicolíticas, inibindo a utilização de outras moléculas de glucose. Para além disso, a alteração do ph reduz a capacidade de ligação do Ca 2+, um importante componente para a contracção muscular. O aumento da [H + ] pode causar fadiga e diminuir a performance muscular durante o exercício. Durante o exercício físico, as fibras musculares podem utilizar a energia 200 vezes mais rapidamente do que durante o repouso. A esta velocidade de utilização, a nossa capacidade de fazer exercício físico ficaria limitada a apenas a alguns minutos se dependessemos somente de ATP-CP e do ácido láctico. De modo a manter o exercício por um período de tempo mais longo, é necessário mudar a estratégia de produção de ATP para um sistema aeróbio. 2
4 Utilização do oxigénio A via aeróbia de funcionamento do ciclo do acido cítrico e da cadeia respiratória mitocondrial (CRM) para formação de ATP só opera na célula em condições em que a quantidade de oxigénio é suficiente. Em contraste com os dois sistemas anteriormente descritos, ATP-CP e ácido láctico, a utilização do oxigénio conduz à produção lenta de grandes quantidades de ATP. O exercício físico de longa duração requer a utilização do ATP produzido no sistema aeróbio (fibras musculares lentas ). Após 2 minutos de uma corrida de longa duração, o sistema aeróbio fornece cerca de 50% da energia para utilização muscular. Após 30 minutos de corrida, o sistema aeróbio fornece cerca de 95% de energia; após 2 horas, o metabolismo aeróbio fornece 98% da energia requerida. O metabolismo aeróbio utiliza inicialmente hidratos de carbono e gorduras. A presença de oxigénio em quantidades suficientes permite que o piruvato entre no ciclo do ácido cítrico via acetil-coa e que ocorra a formação de ATP pela CRM. A principal fonte de ATP para a contracção muscular é a glucose resultante da degradação do glicogénio. Quando necessário, o sistema aeróbio do músculo também pode formar ATP através da degradação dos triglicerídeos e ácidos gordos. Para uma determinada concentração de oxigénio, a gordura liberta mais energia do que os hidratos de carbono (a reserva de glícidos é limitada). Assim, um indivíduo com 68 Kg e 10-20% de gordura corporal, contém reservas de hidratos de carbono (na forma de glicogénio muscular, glicogénio hepático e glucose sanguínea) entre kcal. A suas reservas de gordura permitem-lhe gastar a kcal. Em conclusão: A energia para a actividade muscular provém da produção de ATP nas células musculares, utilizando 3 sistemas de energia diferentes: o sistema ATP-CP (não requer O 2 ), a formação de ácido láctico (requer a glicólise - sistema anaeróbio) e o metabolismo aeróbio, que requer a degradação dos hidratos de carbono ou gorduras, na presença de O 2. Os primeiros dois sistemas constituem a fonte de ATP durante os primeiros minutos de exercício físico de alta intensidade. O terceiro sistema produz ATP a uma velocidade mais baixa e fornece energia para o exercício de endurance. 3
5 Tabela I - Exercício físico e metabolismo Tipo de exercício físico Rápida utilização de energia (início de sprint ou levantamento de pesos) Corrida de m Corrida de m Corrida de 5-10 Km Maratona (42-80 Km) Duração média Sistema ATP-CP anaeróbio - creatina fosfato Ácido láctico (anaeróbio) - glicogénio muscular Metabolismo aeróbio (O 2 ) - glicogénio muscular Metabolismo aeróbio (O 2 ) - glicogénio hepático e glucose do sangue Metabolismo aeróbio (O 2 ) - triglicerídeos (ácidos gordos) % min ,5 min min 15-18,min min + 2 hr 2,5-3 hr 5,5-7 hr 50% 25% 12% 6% * * 50% 65% 10% 63% 50% 12% 3% 25% 44% 88% 97% 75% 35% 5% 5% 20% 60% *A creatina-fosfato é utilizada nos primeiros undos e, se re-sintetizada durante a corrida, é usada até ao final do sprint. NOTA: Dados recentes indicam que os aminoácidos contribuem com 3-6% para a obtenção de energia metabólica durante o exercício físico. 4
6 CASO CLÍNICO - EXERCÍCIO FÍSICO Um corredor de maratona entrou no estádio para a volta final. No último minuto ficou confuso, e começou a correr na direcção errada, acabando por perder os sentidos e cair. Questões: 1. Explique o que aconteceu a este atleta. 2. Que orgãos necessitamos de manter com elevados níveis energéticos de modo permanente? 3. Que tipo de combustível é usado durante o exercício e quais as suas fontes? Existem recursos energéticos alternativos? 4. Quais são as contribuições dos vários orgãos para que seja mantido o funcionamento adequado de orgãos chave, como por exemplo o cérebro? 5. Durante a corrida de maratona o músculo entra em metabolismo anaeróbio e produz lactato. Será vantajosa esta produção? 6. Qual dos atletas terá níveis mais elevados de ácido láctico no sangue: um corredor de maratona ou um sprinter de 800 metros? 7. Que regime dietético prescrevia a um atleta de maratona nos 2-3 dias que antecedem a corrida? Deve aproveitar esta aula para rever: - Metabolismo da glucose e glicogénio - β-oxidação dos ácidos gordos - Interrelações metabólicas dos vários orgãos. 5
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