A DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO DE LEITURA DE ARQUIVOS NO DISCURSO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA DO SCIENCEBLOGS BRASIL 12
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- Fernanda Fraga Quintanilha
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1 61 de 664 A DIVISÃO SOCIAL DO TRABALHO DE LEITURA DE ARQUIVOS NO DISCURSO DE DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA DO SCIENCEBLOGS BRASIL 12 Gerenice Ribeiro de Oliveira Cortes 13 (UESB) RESUMO O estudo analisa o funcionamento da divisão social do trabalho da leitura de arquivos no discurso de divulgação científica (DDC) dos blogs do ScienceBlogs Brasil (Sb.br). Fundamenta-se nos pressupostos da Análise de Discurso (AD) fundada por Pêcheux (1969, 1975), como também nos estudos sobre o ciberespaço e blogs. Os resultados apontam que divulgação é apenas uma evidência ideológica, já que, ao leitor leigo, são destinadas apenas as notícias, comentários e informações vagas sobre os bastidores da ciência, e assim a inclusão científica não se estabelece. Logo, perpetua-se a divisão social do trabalho de leitura de arquivos da ciência. PALAVRAS-CHAVE: discurso de divulgação científica; blogs; divisão social da leitura de arquivos. 12 Este é um breve recorte da pesquisa que venho desenvolvendo em minha Tese de doutorado, no Programa de Pós-Graduação em Letras, com área de concentração em Linguística, na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Agradeço à Professora Drª Evandra Grigoletto, minha orientadora, pelas contribuições dadas na construção deste estudo. 13 Professora Assistente do Departamento de Ciências Humanas, Educação e Linguagem UESB Campus Itapetinga. (cortesgr@gmail.com). cortesgr@gmail.com
2 62 de 664 INTRODUÇÃO Este trabalho busca analisar o modo pelo qual a divisão social do trabalho da leitura de arquivos se estabelece no funcionamento do discurso de divulgação científica (DDC) dos blogs do ScienceBlogs Brasil (Sb.br). Fundamenta-se nos pressupostos da Análise de Discurso (AD) fundada por Pêcheux (1969, 1975), como também nos estudos sobre o ciberespaço e blogs. O Sb.br se propõe a quebrar as barreiras que afastam a ciência da sociedade, todavia, a divulgação é apenas uma evidência ideológica, visto que, ao leitor não especialista, são destinadas apenas as notícias, slogans, comentários e informações vagas sobre os bastidores da ciência. Assim, o leitor não estabelece uma relação com o lugar da ciência e do cientista (ORLANDI,2001). Desse modo, o DDC do Sb.br busca estabilizar sentidos já instituídos historicamente e perpetuar a divisão social do trabalho de leitura de arquivos da ciência. MATERIAL E MÉTODOS A AD de base pêcheuxtiana constitui-se em uma nova forma de ler as materialidades. Busca estabelecer as relações, conjunções, dissociações, entre as materialidades, visando
3 63 de 664 reconstruir o espaço da memória de um corpo sócio-histórico de traços discursivos (PÊCHEUX, 2010a). O sujeito, interpelado ideologicamente, afetado pela história e pelo inconsciente, se inscreve na língua, sendo esta constituída da falha, do equívoco. A relação entre a ideologia e a língua afeta a constituição do sujeito e do sentido, que se constituem mutuamente, o que conduz ao entendimento do discurso como efeito de sentidos entre interlocutores (PÊCHEUX, 2009). Nessa visão, a leitura se distancia da descrição hermenêutica, é um trabalho do sentido sobre o sentido ; todo enunciado pode tornar-se outro, pode haver deslocamentos e deriva de sentidos (PÊCHEUX, 2008). O trabalho de leitura de arquivos busca as discursividades inscritas nas materialidades da língua, sendo o arquivo definido como campo de documentos pertinentes e disponíveis sobre uma questão (PÊCHEUX, 2010b, p. 51). Nesse percurso, mobilizamos também a noção de arquivo pensada por Foucault (2012). A divisão social do trabalho de leitura se inscreve numa relação de dominação (PÊCHEUX, 2010b). A constituição do corpus discursivo, que já é um gesto analítico, será guiada pelo critério teórico. O recorte teórico determinante para esta análise constitui-se das noções de leitura discursiva, arquivo, blogs e condições de produção (CP). O Sb.br é
4 64 de 664 o nosso campo discursivo de referência, do qual extraímos três domínios discursivos: domínio 1 - Posts denominados Sobre; domínio 2 - Posts específicos de divulgação científica; domínio 3 - Posts de comentários dos leitores. Destes domínios, efetuaremos os recortes das sequências discursivas (SDs), num procedimento não-linear. A análise dos dados seguirá os princípios teórico-metodológicos da AD, que não compartimenta teoria e prática. RESULTADOS E DISCUSSÃO O DDC do Sb.br funciona em condições de produção especificas, é textualizado pelo discurso online dos blogs, embora seja atravessado pelo discurso jornalístico. Não se trata de uma tradução, mas é tecido por gestos de interpretação. O blog, como a própria mídia, é considerado um espaço de memória (FONSECA-SILVA, 2007), como um objeto simbólico, e, embora funcione sob o imaginário de liberdade e de acesso pleno, pode exercer controle e interdição. Historicamente, as relações estabelecidas entre o cientista e o leitor não-especialista são tecidas pelo imaginário da ciência enquanto verdade; do cientista, enquanto detentor dessa verdade; e do leitor, imaginariamente ignorante.
5 65 de 664 O público-leitor do DDC do Sb.br constitui-se, por um lado, da grande massa de excluídos do mundo científico, e, por outro lado, de um grupo seleto de cientistas e de leitores especialistas em ciência. Tal divisão foi instituída e determinada historicamente, não surge somente com a emergência das novas tecnologias de linguagem. Conforme essa lógica, o leitor leigo, considerado incapaz, só deve ter acesso à ciência líquida (BAUMAN, 2001), constituída apenas de breves recortes, slogans e notícias dos bastidores e das novidades relativas aos fatos acadêmicos e científicos, sendo tais recortes efetuados por sujeitos que já ocupam um lugar social e uma posição determinada pela formação discursiva (FD) midiática. E assim, o leitor já recebe a leitura pronta, dada, interpretada, ficando apenas com o efeito de cientificidade. Projeta-se para esse leitor, a posição de sujeito consumidor de informações científicas. Reforça-se, portanto, a divisão social do trabalho de leitura de arquivos da ciência, pois alguns são portadores de uma leitura autorizada nesse caso os cientistas e divulgadores enquanto que ao leitor leigo em ciência, é imposto o seu apagamento atrás da instituição que o emprega, nesse caso o ScienceBlogs Brasil.
6 66 de 664 Afetado pelo imaginário da ciência régia (PÊCHEUX, 2008), o Sb.br busca legitimar sentidos da ciência de verdade e da verdade, um pré-construído do discurso científico, que nos reporta à vontade de verdade (FOUCAULT, 2012). Assim, a ciência continua elitizada, os arquivos permanecem vedados e reservados apenas ao cientista, que, no DDC, assume a posiçãosujeito de guardião do saber. Logo, a divulgação científica é apenas uma evidência, um efeito de cientificidade construído na trama discursiva. CONCLUSÕES O imaginário social de liberdade da internet produz o efeito de acessibilidade científica no DDC do Sb.br. Já o imaginário social do leitor leigo determinará a ciência a ser divulgada: ciência-informação, ciência-consumo, um efeito-ciência. Sob tais efeitos, apaga-se o funcionamento da divisão de classes que determina a divisão social do trabalho de leitura de arquivos. Logo, não se institui a aproximação da ciência com a sociedade, embora haja a construção ideológica dessa evidência.
7 67 de 664 REFERÊNCIAS BAUAMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro:Zahar, FONSECA-SILVA, Mª da C. Mídia e lugares de memória discursiva. In.: FONSECA-SILVA, Mª da C. e POSSENTI, S. (Orgs.). Mídia e rede de memória. Vitória da Conquista-BA, Edições UESB, FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense Universitária, [1969] ORLANDI, E. P. Divulgação Científica e o Efeito Leitor: Uma Política Social Urbana. In:GUIMARÃES, Eduardo (Org). Produção e Circulação do Conhecimento:Estado Mídia,Sociedade. Campinas/SP: Pontes, 2001, p PÊCHEUX, M. Leitura e Memória: Projeto de Pesquisa [1982]. In.: ORLANDI, E.P. (Org.) Análise de Discurso: Michel Pêcheux. São Paulo:Pontes Editores, 2011, p PÊCHEUX, M. A análise de discurso: três épocas (1983). In.: GADET, F. e HAK, T. Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas-SP:Editora da Unicamp,[1983]2010a. PÊCHEUX, M. Ler o arquivo hoje. In.: ORLANDI, E. (Org.). Gestos de leitura: da história no discurso. Campinas: Editora da UNICAMP, [1982]2010b, p PÊCHEUX,M. Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Campinas : Editora da Unicamp, [1975] PÊCHEUX, M. O discurso: estrutura ou acontecimento? Campinas-SP: Pontes, [ 982], SCIENCEBLOGS BRASIL Disponível em Acesso: de outubro 2010 a agosto/ O acesso é frequente, já que o presente estudo constitui-se em um recorte da pesquisa de doutorado.
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