PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO ACÓRDÃO

Transcrição

1 Registro: ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº , da Comarca de Pindamonhangaba, em que são apelantes GERDAU S.A e BRADESCO SAÚDE S/A, é apelado ADEMAR ALEXANDRE DA SILVA (JUSTIÇA GRATUITA). ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Recurso da corré Gerdau provido para extinção do feito sem resolução do mérito por sua ilegitimidade passiva. Recurso da corré Bradesco não provido, com a observação de readequação de verba honorária de sucumbência., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores VITO GUGLIELMI (Presidente sem voto), PERCIVAL NOGUEIRA E PAULO ALCIDES. São Paulo, 19 de maio de Rodolfo Pellizari Relator Assinatura Eletrônica

2 Apelação Cível - Digital Processo nº Comarca: 2ª Vara Cível - Pindamonhangaba Apelantes: Gerdau S.A. e Bradesco Saúde S/A Apelado: Ademar Alexandre da Silva (Justiça Gratuita) Voto nº Apelações cíveis. Ação de obrigação de fazer. Plano de saúde empresarial. Encerramento após a aposentadoria e demissão do beneficiário. Sentença de procedência. Inconformismo por ambas as corrés. Legitimidade passiva ad causam. Empregador. Não caracterização. Atuação apenas como interveniente, na condição de mandatário do grupo de empregados, e não como operadora dos planos de saúde. Precedentes. Operadora. Legitimidade caracterizada. Súmula nº 101 deste Egrégio Tribunal de Justiça. Diferenciação entre contribuição do empregado no prêmio e mera coparticipação em procedimentos realizados. Irrelevância. Mesmo nos casos em que o empregador arca integralmente com o valor do plano, o funcionário recebe a cobertura de assistência médica como remuneração indireta. O artigo 458, 2º, IV, da Consolidação das Leis do Trabalho classifica a assistência médica como utilidade concedida pela empregador, o que não descaracterizada a sua natureza de remuneração. Caso concreto. Plano de saúde coletivo do autor com mais de 10 anos de vigência. Dever de se lhe assegurar o direito de manutenção como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, devendo assumir o seu pagamento integral. Artigo 31, caput, da Lei nº 9.656/1998. Sentença parcialmente reformada. Recurso da corré Gerdau provido para extinção do feito sem resolução do mérito por sua ilegitimidade passiva. Recurso da corré Bradesco não provido, com a observação de readequação de verba honorária de sucumbência. Apelação nº Voto nº

3 Trata-se de apelações cíveis contra a r. sentença de fls. 331/333 que, em ação de obrigação de fazer, julgou procedente o pedido, mantendo a tutela provisória de fl. 28 e determinando às corrés a manutenção do autor e de seus dependentes no mesmo plano em que se encontrava quando estava na ativa - em caráter vitalício e desde que assuma o seu pagamento integral -, sob pena de medidas para garantir a efetividade da tutela, além de condená-las no pagamento das custas, despesas processuais e verba honorária, esta fixada em R$ 3.000,00. A corré Gerdau apelou (fls. 336/344), alegando ilegitimidade passiva, impossibilidade de manutenção do plano de saúde de empregado após o término de seu contrato de trabalho, bem como que seu ex-funcionário e autor da ação não contribuía para o plano, uma vez que não rateava o valor do prêmio, pois o segurado assumia um pagamento proporcional apenas e tão somente pelos serviços utilizados. Aduziu inexistir salário indireto, além de o autor não possuir interesse de agir, pois lhe foi oferecida oportunidade de permanecer no plano destinado aos aposentados e demitidos, todavia não permanecendo por sua livre opção. A corré Bradesco também apelou (fls. 347/362), alegando ilegitimidade passiva e ausência de direito de o autor manter sua condição de beneficiário do plano de saúde, nos termos dos artigos 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998, pois ele não contribuía com o custeio dos prêmios, mas apenas coparticipava com alguns procedimentos, conforme dispõe o 6º do artigo 30 de mencionada lei. Salientou, por último, inexistir contribuição indireta no caso Apelação nº Voto nº

4 concreto, com base no artigo 458, 2º, IV, da Consolidação das Leis do Trabalho. Os recursos foram preparados (fls. 345/346 e 363/364), contraarrazoados apenas pelo autor (fls. 367/374 e 375) e recebidos neste grau recursal, sem oposição das partes à realização do julgamento virtual. É o relatório. Cuida-se de ação de obrigação de fazer, relatando o autor em sua inicial que era empregado da corré Gerdau desde , sendo segurado da corré Bradesco Saúde - juntamente com sua esposa e filha como dependentes - e arcando mensalmente com uma percentagem do valor da mensalidade. Contudo, aposentando-se em 2012, sendo demitido sem justa causa em , e tendo negada sua pretensão para continuar com o mesmo plano de saúde, pleiteou seu restabelecimento, mediante a assunção da integralidade das despesas. A tutela provisória foi deferida à fl. 28. Vejamos. Inicialmente, com relação às arguições de ilegitimidade passiva ad causam de ambas as corrés, anota-se assistir razão à exempregadora do autor, uma vez que ela atuava apenas como interveniente, na condição de mandatária do grupo de empregados, e não como operadora dos planos de saúde. Neste sentido, anota-se a recente jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO Apelação nº Voto nº

5 DE SAÚDE. EMPREGADO APOSENTADO. ILEGITIMIDADE DO EMPREGADOR. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a empresa estipulante, em princípio, não possui legitimidade para figurar no polo passivo de demanda proposta por ex-empregado que busca, nos termos dos arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998, a permanência de determinadas condições contratuais em plano de saúde coletivo após a ocorrência da aposentadoria ou da demissão sem justa causa, visto que atua apenas como interveniente, na condição de mandatária do grupo de usuários e não da operadora. 2. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp / SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/02/2017, DJe 02/03/2017). PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE. AÇÃO PROPOSTA POR EX- EMPREGADOR. ARTS. 30 E 31 DA LEI N /1998. DECISÃO MANTIDA. 1. "A empresa estipulante, em princípio, não possui legitimidade para figurar no polo passivo de demanda proposta por ex-empregado que busca, nos termos dos arts. 30 e 31 da Lei nº 9.656/1998, a permanência de determinadas condições contratuais em plano de saúde coletivo após a ocorrência da aposentadoria ou da demissão sem justa causa, visto que atua apenas como interveniente, na condição de mandatária do grupo de usuários e não da operadora. (AgInt no REsp / SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 20/02/2017). Igual sorte, todavia, não assiste à corré Bradesco, uma vez que é ela quem, efetivamente, opera os planos, independentemente de a contratação ter sido firmada por seu empregador ou associação de classe. Justiça: Veja-se, a respeito, a Súmula nº 101 deste Egrégio Tribunal de O beneficiário do plano de saúde tem legitimidade para acionar diretamente a operadora mesmo que a contratação tenha sido firmada por seu empregador ou associação de classe. Quanto ao mérito propriamente dito, não tendo as corrés Apelação nº Voto nº

6 impugnado especificamente a existência do plano de saúde desde o início do contrato de trabalho do autor, e independentemente de discussões consumeristas sobre o caso, é irrelevante o argumento de que o ex-empregado não possuía contribuição efetiva no custeio do plano de saúde, mas mera coparticipação em procedimentos, pois, mesmo nos casos em que o empregador arca integralmente com o valor do plano, o funcionário recebe a cobertura de assistência médica como remuneração indireta. Veja-se a jurisprudência desta E. 6ª Câmara de Direito Privado: PLANO DE SAÚDE COLETIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. Autor aposentado que continuou a laborar e, posteriormente, foi demitido sem justa causa. Preliminares de ilegitimidade passiva e denunciação à lide afastadas. Empregador que atuou como mero intermediário na contratação da apólice de seguro saúde coletivo. Cabe apenas à operadora do plano o ônus de mantê-lo como beneficiário. Mérito. Aplicação do art. 31 da Lei nº 9.656/98. Manutenção do aposentado e sua dependente no plano, mediante o custeio integral do valor. Plano que funcionou sob o regime de coparticipação. Benefício assegurado ao apelado durante todo seu contrato de trabalho. Remuneração indireta. Impossibilidade de exclusão do recorrido e de seu dependente do plano de assistência à saúde. Sentença mantida. PRELIMINARES REJEITADAS. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação cível nº , E. 6ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Paulo Alcides, j ). Embargos infringentes - Plano de saúde - Direito de permanecer com o plano com as mesmas condições de cobertura devendo, todavia, arcar integralmente com o pagamento das parcelas mensais, assumindo a parte paga pela ex-empregadora para ele e seus dependentes - Inteligência do artigo 31 da lei 9.656/98 - Plano que funciona sob o regime de coparticipação - Benefício assegurado ao apelado durante todo seu contrato de trabalho - Remuneração indireta - Impossibilidade de exclusão do recorrido do plano de assistência à saúde - Irrelevância de a contribuição não ter sido realizada por dez anos para o mesmo plano de saúde - Contribuição para outras operadoras de plano de saúde por quinze anos antes de a Apelação nº Voto nº

7 embargada assumir a carteira de beneficiários - Embargos acolhidos. (Embargos Infringentes nº /50000, E. 6ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Eduardo Sá Pinto Sandeville, j ). PRELIMINAR - Ilegitimidade passiva - Exclusão do exempregador do polo passivo da ação - Admissibilidade - A operadora do plano contratado é quem administra o seguro saúde, respondendo direta ou indiretamente pelo serviço de saúde disponibilizado - Preliminar afastada. AÇÃO ORDINÁRIA - Parcial procedência - Autor contribuiu com o plano de saúde familiar por mais de trinta e cinco anos, até a sua dispensa sem justa causa - Art. 31 da Lei 9.656/98 - Deve ser assegurado ao funcionário inativo a permanência no plano de saúde familiar mantido pelo ex-empregador, com o qual contribuiu por mais de dez anos, desde que haja assunção da cota patronal - Hipótese que se subsumi ao disposto no art. 31 da Lei nº 9656/98 - Resolução administrativa da ANS que não pode extrapolar a lei naquilo que com ela colide, e tão pouco ferir direitos assegurados - Mensalidade deverá ser suportada integralmente pelo autor, mantendo-se as mesmas condições de grupo familiar ao qual fazia parte, ou seja, a mensalidade de R$ 704,73, deverá incluir os dependentes - Precedentes da Corte e da Câmara - Apelos (autor e réu) desprovidos - Sentença mantida. (Apelação cível nº , E. 6ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Percival Nogueira, j ). Consigna-se que o artigo 458, 2º, IV, da Consolidação das Leis do Trabalho classifica a assistência médica como utilidade concedida pelo empregador, o que não descaracterizada a sua natureza de remuneração. Sobre o tema, anota-se o seguinte trecho de julgado deste Egrégio Tribunal de Justiça: (...) Mérito Recursal. Insurgência que se revela infundada. Lei que assegura a manutenção do plano de saúde para aqueles que contribuíram por mais de dez anos enquanto mantinham o vínculo empregatício. Aplicação do artigo 31 da Lei no. 9656/98. Valor total assumido pela empregadora que constitui mera liberalidade e implica em salário indireto. Autor que faz jus a ser mantido, juntamente com seus dependentes em plano de saúde, pagando, doravante, valor Apelação nº Voto nº

8 integral. Descrição da assistência à saúde como sendo "utilidade" e não como "salário" no artigo 458, parágrafo segundo, inciso IV, da CLT, que não descaracteriza sua natureza essencialmente remuneratória. Cota do empregado, que sempre foi paga pelo empregador em razão do vínculo empregatício, considerada parcela salarial indireta (...). (Apelação cível nº , E. 9ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Alexandre Bucci, j ). Desta maneira, nos termos do artigo 31, caput, da Lei nº 9.656/1998, tendo o plano de saúde coletivo do autor mais de 10 anos de vigência, deve ser assegurado o seu direito de manutenção - juntamente com seus dependentes - como beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, devendo assumir o seu pagamento integral. Assim, tendo em vista a ilegitimidade passiva da corré Gerdau, extingue-se o feito sem resolução do mérito com relação a ela, nos termos do artigo 485, VI, do Código de Processo Civil, arcando o autor com o pagamento das custas, despesas processuais e verba honorária, esta fixada em R$ 1.500,00, com base no artigo 85, 8º, do mesmo diploma legal, ressalvada a gratuidade judiciária. Com relação à corré Bradesco, mantém-se a r. sentença de procedência do pedido, cuja verba honorária de sucumbência, que havia sido fixada para as duas corrés conjuntamente, é fixada neste momento processual, em virtude da ilegitimidade ad causam da outra corré, também por apreciação equitativa, no patamar de R$ 1.500,00. Ante o exposto, dá-se provimento ao recurso da corré Gerdau e nega-se provimento ao recurso da corré Bradesco, com a observação de readequação de verba honorária de sucumbência. Apelação nº Voto nº

9 Rodolfo Pellizari Relator Apelação nº Voto nº