Supremo Tribunal Federal

Transcrição

1 AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA MATO GROSSO RELATORA AUTOR(A/S)(ES) PROC.(A/S)(ES) RÉU(É)(S) PROC.(A/S)(ES) : MIN. CÁRMEN LÚCIA :MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO :PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO :MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA DECISÃO CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E ESTADUAL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA DIRIMIR O CONFLITO. ATRIBUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. O caso 1. Conflito negativo de atribuições apresentado neste Supremo Tribunal, em , e autuado como ação cível originária, objetivandose a solução de conflito negativo de atribuições entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público de Mato Grosso para apuração de supostas irregularidades nas inscrições no Programa Minha Casa Minha Vida. 2. Em , o Digi-Denúncia recebeu denúncia anônima oriunda de Caçapava do Sul/MT, na qual se noticiavam irregularidades nas inscrições para o Programa Minha Casa Minha Vida. 3. Em , a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão da Procuradoria da República no Mato Grosso declinou da atribuição para o Ministério Público de Mato Grosso, com os seguintes fundamentos:

2 a leitura sistemática da Constituição Federal permite concluir pela atribuição do combativo Parquet Estadual para apurar e exigir o escorreito cadastramento dos beneficiários do programa Minha Casa, Minha Vida pelos municípios do Estado de Mato Grosso, pois legítimo fiscal dos atos de gestão estaduais e municipais em cumprimento aos comandos da Constituição da República (fl. 19). 4. Em , a Quarta Promotoria de Justiça Cível da Comarca de Sinop/MT suscitou o presente conflito negativo de atribuições para este Supremo Tribunal e salientou haver interesse da União em fiscalizar a aplicação dos recursos federais usados para gerir o Programa Minha Casa Minha Vida. Examinados os elementos havidos nos autos, DECIDO. 5. O objeto da presente ação cível originária é a definição da atribuição do Ministério Público Federal ou do Ministério Público de Mato Grosso para apurar eventuais irregularidades nas inscrições no Programa Minha Casa Minha Vida. 6. O presente conflito de atribuições deve ser conhecido. Na assentada de , ao julgar a Petição n /BA, Relator o Ministro Marco Aurélio, o Supremo Tribunal Federal reconheceu competência para solucionar conflito de atribuições entre órgãos no Ministério Público de diferentes entidades da federação, como previsto no art. 102, inc. I, al. f, da Constituição da República: COMPETÊNCIA - CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES - MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL VERSUS MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. Compete ao Supremo a solução de conflito de atribuições a envolver o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual. conflito NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES - MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL VERSUS MINISTÉRIO 2

3 PÚBLICO ESTADUAL - ROUBO E DESCAMINHO. Define-se o conflito considerado o crime de que cuida o processo. A circunstância de, no roubo, tratar-se de mercadoria alvo de contrabando não desloca a atribuição, para denunciar, do Ministério Público Estadual para o Federal (PET 3.528/BA, Relator o Ministro Marco Aurélio, Plenário, DJ ). 7. Ação análoga à presente foi decidida, em , pelo Ministro Dias Toffoli, fixando-se a atribuição do Ministério Público Federal para apurar denúncia quanto a irregularidades apontadas na fase de seleção e cadastro dos beneficiários do Programa Minha Casa Minha em Mato Grosso (Ação Cível Originária n /MT, decisão monocrática, DJe 1º ). Salientou-se, naquela decisão, haver conclusão no mesmo sentido na Ação Cível Originária n /BA. Esclareceu-se ter sido o parecer do Procurador-Geral da República pela atribuição do Ministério Público Federal para apurar irregularidades na seleção de beneficiários do Programa Minha Casa Minha no Município de Lauro de Freitas/BA. O parecer do Procurador-Geral da República na ACO 2.289/BA foi assim fundamentado: 19. O Programa minha casa minha Vida (PMCMV), criado pela Lei n /2009, é programa habitacional federal, regulamentado pelo Poder Executivo federal e subsidiado pela União. (...) 21. É certo, como apontado pelo suscitado, que a fase de seleção e cadastro dos beneficiários do programa ficou a cargo de órgãos estaduais/municipais, como inicialmente definido pela Portaria 140, de ( ) 22. (...) Ou seja: a autonomia dos entes na fixação dos critérios é mínima, o que equivale a dizer que agem, mesmo nessa etapa, como agentes de execução de programa, confirmando-se o seu caráter integralmente federal. 3

4 23. Entende-se, assim, que qualquer irregularidade ocorrida, ainda que em etapa de responsabilidade do Município, trará prejuízo direto à União, porque a seleção de pessoa ou família que não atenda aos critérios estabelecidos - no âmbito federal -, em detrimento do direito daquelas que os atendem, revela malversação de verbas federais, como notado pelo suscitante. Verificado que o cadastro equivocado beneficiará terceiro não enquadrado nos requisitos legais, o que há, em última análise, é desvio de verbas federais. (...) 25. Como existe, assim, interesse direto da União em fiscalizar e manter a devida aplicação dos recursos federais destinados ao programa, o que garantirá o seu bom desenvolvimento e execução, a competência para processar e julgar eventual demanda decorrente dos fatos é da Justiça Federal, consoante a norma do art. 109, I, da Constituição (grifos nossos). 8. Como realçado pelo Ministro Dias Toffoli nas ACO 2.456/MT e 2.289/BA, a União dispõe de interesse direto na execução das ações relacionadas ao Programa Minha Casa Minha Vida e na correta aplicação dos recursos federais repassados ao Mato Grosso. O interesse da União não se restringe em fiscalizar a aplicação dos recursos federais repassados, mas também a monitorar se a fase de seleção e cadastro dos beneficiários do referido Programa atende os objetivos almejados. As medidas a serem adotadas por eventuais irregularidades nas inscrições para participação no aludido Programa devem ser coordenadas e promovidas pelo Ministério Público Federal, na linha dos precedentes e da manifestação do Procurador-Geral da República na ACO 2.289/BA. 9. A jurisprudência deste Supremo Tribunal é no sentido de, havendo irregularidades na aplicação de recursos federais, afirmar-se o interesse da União: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES ENTRE O 4

5 MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR A AÇÃO. PRECEDENTES. CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES. APURAÇÃO DE SUPOSTAS IRREGULARIDADES NA APLICAÇÃO DOS RECURSOS ORIUNDOS DO PRONAF. INTERESSE DA UNIÃO. ART. 109, INC. I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ATRIBUIÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. (ACO 1.281/SP, de minha relatoria, Plenário, DJe , grifos nossos). EMENTA Agravo regimental em ação cível originária. Conflito de atribuição entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado de São Paulo. Concorrência de atribuições. Possibilidade. 1. Conflito negativo de atribuições, instaurado pelo Procurador-Geral da República, entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado de São Paulo quanto a investigar irregularidades detectadas pela Controladoria-Geral da União na aplicação de recursos públicos federais no Município de Pirangi/SP. 2. A análise do caso revela não existir o alegado conflito de atribuições, não havendo, ao menos por ora, como identificar atribuição única e exclusiva do Ministério Público Federal ou do Parquet estadual. Foram constatadas várias irregularidades que apontam para níveis de ineficiência administrativa municipal. 3. As falhas apontadas deram-se em programas federais, os quais contam com recursos derivados dos cofres da União, o que, por si só, já resulta no imediato e direto interesse federal na correta aplicação das verbas públicas, haja vista que a debilidade de gestão resulta igualmente na malversação de patrimônio público federal, independentemente da efetiva ocorrência de desvio de verbas. No caso de eventual ajuizamento de ação civil pública, por restar envolvido o interesse da União na correta aplicação dos recursos federais, será competente a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal. Precedente: ACO nº 1.281/SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 14/12/ Essa atribuição do Parquet federal não exclui, contudo, a atribuição do Ministério Público do Estado de São 5

6 Paulo de também atuar no presente caso, pois além do dever de zelar pela eficiência administrativa municipal, não se pode descartar, de início, a possibilidade de haver recursos públicos estaduais e municipais envolvidos. 5. O aprimoramento dos mecanismos de controle da administração pública sempre se demonstra benéfico, sendo dotado cada órgão ministerial de independência suficiente para conduzir as apurações da forma que melhor lhe aprouver, sem que tal situação gere interferência indevida entre ambos. 6. Agravo regimental a que se nega provimento. (ACO AgR/SP, Relator o Ministro Dias Toffoli, Plenário, DJe 1º , grifos nossos). 10. Pelo exposto, conheço da presente Ação Cível Originária e declaro a atribuição do Ministério Público Federal para investigar e apurar a Notícia de Fato n /2013 PR/MT. Grosso. Remetam-se os autos à Procuradoria da República em Mato Publique-se. Brasília, 16 de setembro de Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora 6