TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº , da Comarca de Miracatu, em que é agravante MUNICÍPIO DE MIRACATU, é agravado PAULO PACHECO. ACORDAM, em 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento em parte ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERREIRA RODRIGUES (Presidente) e ANA LIARTE., 6 de junho de PAULO BARCELLOS GATTI RELATOR Assinatura Eletrônica

2 4ª Câmara AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE MIRACATU AGRAVADO: PAULO PACHECO ORIGEM: 2ª VARA JUDICIAL DA COMARCA DE MIRACATU VOTO Nº AGRAVO DE INSTRUMENTO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE E OUTRAS VERBAS PROVA PERICIAL CUSTEIO Decisão do Juízo a quo que imputou ao Município requerido o ônus de arcar com os honorários do perito O adiantamento dos honorários de perícia requerida por ambas as partes deve ser rateado proporcionalmente entre elas, em conformidade com o disposto no art. 95, do CPC 2015 Considerando que ao agravado foi concedido o benefício da gratuidade processual, o adiantamento de sua parcela deve ser custeado pela Defensoria Pública, entidade responsável por administrar o Fundo de Assistência Judiciária, criado pela Lei Estadual nº 4.476/84 e regulamentado pelo Decreto Estadual /85 Existência de Deliberação nº 92/2008 do Conselho Superior da Defensoria Pública que dispôs sobre o pagamento, pelo FAJ, de peritos que atuem nos feitos de natureza cível em que partes são beneficiárias da gratuidade judicial Inteligência do art. 95, 3º, II, do CPC Decisão reformada - Recurso provido em parte. Vistos. Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo MUNICÍPIO DE MIRACATU contra a r. decisão interlocutória proferida pelo Juízo a quo (fls. 115) que, nos autos da ação condenatória proposta em desfavor daquele pelo agravado PAULO PACHECO, determinou Agravo de Instrumento nº Voto nº 2

3 que o Município demandado providenciasse o depósito dos honorários periciais arbitrados em R$ 4.200,00. Inconformado, sustenta o Município em suas razões (fls. 01/11) que cabe ao autor arcar com o pagamento da remuneração do perito, conforme disposto nos artigos 82 e 95 do CPC 2015, ressaltando que o simples fato de o requerente ser beneficiário da justiça gratuita não configura motivo suficiente para inversão do ônus financeiro. Ao final, após pleitear a concessão de efeito suspensivo, pugna pelo provimento do recurso para o fim de impor ao autor/agravado o ônus de arcar com os honorários da prova pericial. Preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal (art , inciso I cc. arts e 1.017, do CPC/2015), o agravo foi recebido com efeito suspensivo (fls. 118), e não respondido (fls. 124). Este é, em síntese, o relatório. VOTO Colhe-se dos autos que o autor é servidor público municipal e atualmente exerce o cargo efetivo de motorista, em função do qual aufere adicional de insalubridade na ordem de 40% sobre o salário mínimo Agravo de Instrumento nº Voto nº 3

4 federal vigente. Ocorre que, segundo alega, a base de cálculo do referido adicional não deveria ser o salário mínimo, mas sim o salário profissional do servidor, acrescentando que a Municipalidade não respeita o horário reservado para descanso e não paga as horas extraordinárias, o auxílio alimentação e o salário família. Diante disso, com o propósito de regularizar a situação, o autor PAULO PACHECO ingressou com a presente demanda em face do MUNICÍPIO DE MIRACATU, pleiteando a condenação do requerido ao pagamento do adicional de insalubridade sobre o salário profissional ou, subsidiariamente, sobre o salário mínimo estadual, bem como ao pagamento do intervalo intrajornada, horas extraordinárias, auxílio alimentação e salário-família, acrescidos dos respectivos reflexos e consectários legais (fls. 01/11). Após a apresentação de contestação e réplica, foi concedida oportunidade para que autor e Municipalidade especificassem provas que pretendiam produzir (fls. 86), tendo ambas as partes requerido expressamente a realização de prova pericial (fls. 88 e 90). Ato contínuo, foi deferida a prova pericial (fls. 100) e, considerando que não houve qualquer manifestação sobre a estimativa de honorários periciais elaborada pelo expert (fls. 114), o Juízo a quo determinou que o Município demandado providenciasse Agravo de Instrumento nº Voto nº 4

5 o depósito dos honorários periciais arbitrados em R$ 4.200,00, decisão esta contra a qual foi interposto o presente agravo de instrumento. Pelo que se depreende do acervo fáticoprobatório coligido ao instrumento, o recurso comporta parcial acolhimento. Pois bem, estabelece a nova lei processual que, salvo exceção concernente à justiça gratuita, incumbe às partes antecipar o pagamento dos atos que requererem no processo (art. 82, do CPC 2015), sendo que a remuneração do perito judicial deverá ser adiantada pela parte que houver requerido a perícia ou rateada quando esta for determinada de ofício ou requerida por ambas as partes (art. 95, do CPC 2015), in verbis: Art Salvo as disposições concernentes à gratuidade da justiça, incumbe às partes prover as despesas dos atos que realizarem ou requererem no processo, antecipando-lhes o pagamento, desde o início até a sentença final ou, na execução, até a plena satisfação do direito reconhecido no título. Art Cada parte adiantará a remuneração do assistente técnico que houver indicado, sendo a do perito adiantada pela parte que houver requerido a perícia ou rateada quando a perícia for determinada de ofício ou requerida por ambas as partes. Na hipótese sub judice, a prova pericial Agravo de Instrumento nº Voto nº 5

6 foi expressamente requerida por ambas as partes, de modo que o adiantamento da remuneração do expert deve ser rateado entre elas em proporções iguais, ou seja 50% para cada uma. Todavia, sendo o autor beneficiário da assistência judiciária gratuita (fls. 159) e, portanto, incapaz de custear as despesas processuais sem prejuízo de seu próprio sustento e o de sua família, não pode ser responsabilizado pelo pagamento dos honorários periciais. Nessas circunstâncias, consoante inteligência do artigo 95, 3º, II, do CPC , a parcela da remuneração pericial de responsabilidade do beneficiário da justiça gratuita deverá ser custeada com recursos alocados no orçamento do Estado. Destarte, os honorários periciais devem ser custeados pela Defensoria Pública, já que esta entidade é responsável por administrar o Fundo de Assistência Judiciária - FAJ, criado pela Lei Estadual 4.476/84 e regulamentado pelo Decreto Estadual /85, cujos recursos se destinam a custear despesas concernentes à prestação de assistência judiciária gratuita aos legalmente necessitados. Impende-se consignar, neste ponto, a 1 3o Quando o pagamento da perícia for de responsabilidade de beneficiário de gratuidade da justiça, ela poderá ser: I - custeada com recursos alocados no orçamento do ente público e realizada por servidor do Poder Judiciário ou por órgão público conveniado; II - paga com recursos alocados no orçamento da União, do Estado ou do Distrito Federal, no caso de ser realizada por particular, hipótese em que o valor será fixado conforme tabela do tribunal respectivo ou, em caso de sua omissão, do Conselho Nacional de Justiça. Agravo de Instrumento nº Voto nº 6

7 Deliberação nº 92/2008 do Conselho Superior da Defensoria Pública que dispõe sobre o pagamento, pelo FAJ, de peritos que atuem nos feitos de natureza cível, de competência da Justiça Estadual, em que o ônus da prova pericial tenha sido atribuído à parte beneficiária da assistência judiciária gratuita, in verbis: Art. 1º - O pagamento de perito indicado para atuar em processo judicial de natureza cível, de competência da Justiça Estadual, em que o ônus da prova pericial tenha sido atribuído à parte beneficiária da assistência judiciária gratuita, será feito com recursos do Fundo de Assistência Judiciária - FAJ, quando houver recursos orçamentários e financeiros disponíveis, até os limites previstos na seguinte tabela: Classe Valor da Causa Honorários Classe 1 Até R$ R$ 292,00 Classe 2 De R$ 5.000,01 a R$ ,00 R$ 331,00 Classe 3 De R$ ,01 a R$ ,00 R$ 373,00 Classe 4 De ,01 a R$ ,00 R$ 484,00 Classe 5 De R$ ,01 a R$ ,00 Classe 6 De R$ ,01 a R$ ,00 Classe 7 Acima de R$ ,00 R$ 628,00 R$ 728,00 R$ 883,00 Parágrafo primeiro - Os valores de que trata este artigo compreendem a totalidade dos honorários e das demais despesas do perito, englobando eventuais ou necessários reparos e emendas aos serviços técnicos apresentados no processo judicial. Parágrafo segundo O pagamento de peritos, nos termos desta Deliberação, deverá ser suportado exclusivamente com recursos disponíveis no Fundo de Assistência Judiciária FAJ e não poderá ultrapassar o montante constante da tabela do Agravo de Instrumento nº Voto nº 7

8 caput do presente artigo, ainda que superior o valor arbitrado pelo juiz da causa a título de honorários periciais, sendo que o levantamento deste numerário implicará quitação e renúncia ao direito de reclamar saldos desta contraprestação. Art. 3º - Não poderá ser deferido, na forma desta Deliberação, o pedido de pagamento: I - de perícias já realizadas; II - complementar ou extra, no caso de perícia anteriormente paga; III - de honorários provisórios; IV - quando a perícia for objeto de carta precatória, sendo o deprecante Juízo situado em território de outra unidade da federação; V - quando a perícia for solicitada por autoridade judiciária da Justiça Federal, da Justiça do Trabalho ou da Justiça Estadual no exercício da competência federal delegada, nos termos dos artigos 109, 3º, e 112, ambos da Constituição Federal; VI - quando a perícia for relacionada com a área médica, em face do convênio com o Instituto de Medicina Social e de Criminologia de IMESC, desde que a perícia seja realizada por referido Instituto; VII - nas hipóteses do artigo 684 do Código de Processo Civil; VIII - nas hipóteses do artigo 652, 1º, do Código de Processo Civil, quando a atribuição da perícia avaliatória for de oficial de justiça; IX - de perícias sociais e psicológicas, desde que haja na Comarca servidor do Poder Judiciário apto à realização da perícia; X na hipótese de avaliação de veículos automotores, em que dispensável a perícia, por força da existência de tabelas acessíveis em jornais de grande circulação ou via internet, salvo situações excepcionais devidamente fundamentadas; XI de perícias de interesse do Ministério Público ou de pessoas jurídicas não beneficiárias da assistência judiciária gratuita. (Inciso alterado pela Deliberação CSDP nº 177, de 28 de maio de 2010). XII - de perícias contábeis que correspondam à mera atualização ou verificação de cálculo. Art. 4º - Sendo vencedora na demanda a parte Agravo de Instrumento nº Voto nº 8

9 beneficiária da justiça gratuita, em cujo interesse foi realizado o pagamento da perícia, deverá ser providenciada a restituição à Defensoria Pública do valor despendido, com a devida atualização monetária e juros. Interpretando-se os dispositivos citados, conclui-se ser possível o pagamento de metade dos honorários periciais com recursos do FAJ na hipótese dos autos, tendo em vista a inexistência das exceções previstas no art. 3º da Deliberação nº 92/2008. Assim, não pode ser acolhida a tese de que a Municipalidade arque com o integral pagamento dos honorários periciais, pois a produção de prova pericial para comprovar a existência ou inexistência dos fatos constitutivos alegados na inicial foi requerida por ambas as partes, sendo de rigor a divisão entre elas (50%/50%) dos custos dos honorários periciais. Confira-se, nessa linha, o entendimento desta Colenda Corte de Justiça em casos análogos: Cobrança de diferenças. Seguro DPVAT. Prova pericial determinada pelo juízo. Pagamento a cargo da ré. Intelecção do art. 33 do CPC. Honorários periciais devem ser suportados por quem os pleiteou, e, em caso de determinação pelo juiz, a prova deve ser suportada pelo demandante. Porém, na hipótese de haver concessão das benesses da justiça gratuita, caso dos autos, cabe ao Estado arcar com a realização material da prova, por meio de seus órgãos oficiais. Deve ou pode ser usado o Convênio da antiga PAJ, atual Defensoria, ou o IMESC, quando a Comarca ficar próxima à Agravo de Instrumento nº Voto nº 9

10 Capital. Agravo da Seguradora parcialmente provido. (AI nº , 27ª Câmara de Direito Privado, Rel. CAMPOS PETRONI, j ) AGRAVO DE INSTRUMENTO - Justiça gratuita - Perito - Honorários - Abrangência - Gratuidade que não se refere apenas às custas processuais - Aplicação do artigo 3º, inciso V, da Lei nº 1.060/50 - O benefício da justiça gratuita abrange também os honorários de perito Imposição do pagamento ao Fundo de Assistência Judiciária FAJ, já que o autor é beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita, ou ainda que seja nomeado perito de estabelecimento oficial especializado ou repartição administrativa do ente público responsável pelo custeio da prova pericial Impossibilidade de imposição, ao beneficiário da gratuidade, de complementação das despesas periciais Decisão reformada - Recurso provido. (AI nº , 5ª Câmara de Direito Privado, Rel. MOREIRA VIEGAS, j ) AGRAVO DE INSTRUMENTO Ação de usucapião Autora beneficiária da assistência jurídica gratuita Necessidade de realização de perícia Despesas com a perícia arbitradas em R$ 1.300,00 Determinação de depósito pela requerente Inconformismo A benesse da justiça gratuita deve ser integral, abrangendo as despesas com a perícia Deliberação de n 92, de 29/08/08, do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado, que fixa os limites dos honorários Decisão reformada, para afastar a imposição de pagamento, aos autores, das despesas periciais Recurso provido. (AI nº , 2ª Câmara de Direito Privado, Rel. JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES, j ) Mandado de Segurança - Justiça gratuita - Agravo de Instrumento nº Voto nº 10

11 Direito constitucionalmente garantido - Possibilidade de utilização de verba do Fundo de Assistência Judiciária para perícias em ações em que as partes sejam beneficiárias da justiça gratuita, mesmo não patrocinadas por defensores públicos. Recurso de apelação e reexame necessário não providos. (AP nº , 2ª Câmara de Direito Público, Rel. JOSÉ LUIZ GERMANO, j ) Ressalta-se, ainda, que não se desconhece o quanto restou consignado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça no AgRg no REsp /MG no sentido de que: A jurisprudência majoritária desta Corte comunga do entendimento de que o ônus de arcar com honorários periciais, na hipótese em que a sucumbência recai sobre o beneficiário da assistência judiciária, deve ser imputado ao estado, que tem o dever constitucional de prestar assistência judiciária aos hipossuficientes (Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/03/2013, DJe 18/03/2013). Todavia, o julgado em questão refere-se ao Estado de Minas Gerais e, na hipótese sub examine, o Estado de possui Deliberação nº 92/2008 do Conselho Superior da Defensoria Pública, que dispõe expressamente sobre o pagamento (pelo FAJ) de peritos que atuem nos feitos de natureza cível, de competência da Justiça Estadual, em que o ônus da prova pericial tenha sido atribuído, ainda que parcialmente, à parte beneficiária da assistência judiciária gratuita. Portanto, levando-se em consideração a Agravo de Instrumento nº Voto nº 11

12 peculiaridade da situação e a necessidade de realização de perícia para que autor e réu possam comprovar suas alegações, é de rigor que a Municipalidade arque com 50% do adiantamento dos honorários periciais, cabendo à Defensoria Pública disponibilizar o restante do valor necessário para o pagamento dos honorários periciais até o limite admitido pela Deliberação nº 92/2008, do Conselho Superior da Defensoria Pública -, haja vista ser o requerente beneficiário da justiça gratuita. Caso inviável ou não aceito pelo perito designado, nada impede que seja nomeado outro expert para o exercício do ofício ou que se utilize de peritos municipais, estaduais e/ou federais que atuem graciosamente ou por quantia módica, se for o caso, ressalvando-se a possibilidade, ainda, de que seja reconsiderada a necessidade de realização de prova pericial, já que a discussão nos autos não diz respeito à necessidade ou não de pagamento do adicional de insalubridade, mas tão somente à sua base de cálculo salário mínimo ou salário profissional -, questão essa essencialmente de direito. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da Municipalidade agravante, de modo a reformar a r. decisão interlocutória proferida pelo Juízo a quo para o fim de determinar que adiantamento da remuneração do expert seja rateado entre as partes em proporções iguais, ou seja 50% para cada uma, observando-se que a parcela de responsabilidade do autor, beneficiário da Agravo de Instrumento nº Voto nº 12

13 justiça gratuita, deve ser paga por meio de recursos disponíveis no Fundo de Assistência Judiciária FAJ, nos limites estabelecidos pela Deliberação nº 92/2008, do Conselho Superior da Defensoria Pública. Caso inviável ou não aceito pelo perito designado, nada impede que seja nomeado outro expert para o exercício do ofício ou que se utilize de peritos municipais, estaduais e/ou federais que atuem graciosamente ou por quantia módica, se for o caso, ressalvando-se a possibilidade, ainda, de que seja reconsiderada a necessidade de realização de prova pericial, já que a discussão nos autos não diz respeito à necessidade ou não de pagamento do adicional de insalubridade, mas tão somente à sua base de cálculo salário mínimo ou salário profissional -, questão essa essencialmente de direito. PAULO BARCELLOS GATTI RELATOR Agravo de Instrumento nº Voto nº 13