Português /2017
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- João Pedro Cunha Chaplin
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1 Português /2017 AUTO DA BARCA DO INFERNO DE GIL VICENTE TÍTULO: A obra intitula-se Auto da Barca do Inferno, porque a maioria das personagens embarca na barca do. CLASSIFICAÇÃO DA OBRA: A obra é um auto de moralidade, porque revela os vícios, os defeitos e os costumes da época de Quinhentos, criticando-os de modo a moralizar a sociedade. ASSUNTO: O auto apresenta a dualidade BEM / MAL, simbolizada pelas personagens alegóricas, ANJO e DIABO, as quais se encontram na respetiva BARCA, atracada no CAIS. Aqui surgem várias ALMAS que, através do diálogo com o e /ou o, expõem a sua vida, carregada de vícios, o que as leva à condenação. SIMBOLOGIA DO CENÁRIO: Cais - representa o tribunal no qual somos julgados segundo o nosso comportamento enquanto vivos. Barcas - simbolizam a partida para o outro mundo; Rio - simboliza a divisão e a transição entre este mundo e o outro. PERSONAGENS: / : Semelhanças São personagens alegóricas; Nenhum deles tenta recuperar as personagens que entram em cena; Ambos avaliam o tipo de vida das personagens, realçando os aspetos negativos (na generalidade); Ambos têm uma única função: condenar () ou salvar (). Diferenças : espera um grande número de passageiros, por isso enfeita a barca _ Põe bandeiras, que é festa ; : Confiante de que não terá muita gente _ ( ) veremos se vem alguém/ merecedor de tal bem ( ); : linguagem sarcástica, irónica, zombeteira, crítica, agressiva e, por vezes, chocante; : sóbrio na linguagem e nos gestos; : lembra às personagens que o destino já se encontra traçado, referindo os seus vícios; : o julgamento é definitivo. Personagens-tipo: Semelhanças Grande apego aos bens materiais e ao seu tipo de vida (exceções. Parvo, Cavaleiros); Não existe um arrependimento real, embora, por vezes, haja uma tomada de consciência do erro; Visão deturpada da religião; Fazem-se acompanhar de símbolos cénicos (exceção: Parvo). Diferenças Percurso cénico Representatividade dos símbolos.
2 Relações entre as personagens: Joane / : a ingenuidade do Parvo estanca a veia satírica e paralisa a agressividade do. Joane / : o Parvo tem uma atitude de humildade e simplicidade. Alcoviteira / : trata-o com rispidez e secura, pois acredita que não vai para o Inferno. / Alcoviteira: é irónico. Alcoviteira / : tenta seduzir o, utilizando uma linguagem bajuladora. / Alcoviteira: trata-a rudemente, menosprezando-a. Tem ainda uma atitude de indiferença. Alcoviteira / Corregedor: recebe-o mal, porque, em vida, a mandara açoitar. Cavaleiros / : o segundo fica surpreendido com a segurança dos cruzados. Por sua vez, estes reagem com arrogância à interpelação do, achando-a ousada. TEMPO: Situando-se num plano extraterreno, a ação não apresenta uma evolução cronológica. CRÍTICA: Nesta peça, Gil Vicente denuncia os vícios da sociedade portuguesa quinhentista, segundo o lema latino ridendo castigat mores, isto é, a rir se corrigem os costumes. Assim, são criticados: A falsa prática religiosa; A corrupção da justiça; O judaísmo; A exploração; A tirania, A ganância; A vaidade; Desregramento sexual; A ostentação; Desprezo pelos humildes; A ignorância e a credulidade; A frivolidade. INCONGRUÊNCIAS DA PEÇA: Florença não fala durante a cena, nem é julgada; contudo, entra na barca do inferno; O Parvo, apesar de ser inculto, fala latim macarrónico. ESTRUTURA EXTERNA: Os textos dramáticos organizam-se, habitualmente, em atos que contêm diversas cenas. Tal não acontece no Auto da Barca do Inferno, embora não seja difícil dividir em cenas esta peça de Gil Vicente. Assim, temos as seguintes cenas: Introdutória: diálogo entre o e o Companheiro ( curta) Fidalgo (cena longa); Onzeneiro (cena curta); Parvo (cena curta); Sapateiro (cena curta); Frade (cena longa); Alcoviteira (cena curta); Judeu (cena curta); Corregedor e Procurador (cena longa); Enforcado (cena curta); Cavaleiros (cena curta). A estrutura repetitiva da peça é quebrada por: Cenas longas intercaladas com cenas curtas; Introdução de irregularidades e assimetrias: cantos do e do Frade, o Frade a dançar, aparelhamento da barca do inferno, ordens dadas pelo diabo ao Companheiro. A peça é constituída por oitavas, com versos em redondilha maior, seguindo o esquema rimático abbaacca.
3 ESTRUTURA INTERNA: Cada cena, exceto a inicial, apresenta as três partes clássicas: Exposição: breve apresentação da personagem; Conflito: interrogatório feito pelo e pelo ; Desenlace: atribuição da sentença. O CÓMICO: Cómico de carácter: A loucura de Joane e a inconsciência dos seus atos e das suas palavras. Um frade dançarino e enamorado (desajuste entre o que a personagem deveria ser e a realidade) Cómico de linguagem: Uso do calão Frases desconexas proferidas por Joane As respostas absurdas de Joane Ironia Latim macarrónico Falas de Brísida Vaz Cómico de situação: O Fidalgo que entra em cena presunçoso e seguro da sua salvação Surpresa do Onzeneiro ao ver o Fidalgo na Barca do Inferno Um frade que canta, dança e se faz acompanhar de uma moça Lição de esgrima que o Frade dá ao Encontro do Corregedor com Brísida Vaz na Barca do Inferno LINGUAGEM: A linguagem apresenta-se como um meio caracterizador das personagens, dos estatutos, das profissões, dos vícios, dos destinos, etc. Assim, Joane utiliza uma linguagem indecorosa, injuriosa, rude e agressiva; a do Sapateiro é desbragada e rude, registando-se a presença de alguns tecnicismos ( badana, cordovão, etc.); o interesse que o Frade demonstra pela esgrima está patente nos termos técnicos a que recorre com frequência; a Alcoviteira apresenta uma linguagem ambígua e deturpada, invertendo o sentido das palavras que se encontram nos textos religiosos; o Judeu recorre ao calão; o Corregedor usa o latim. A linguagem transmite ainda o tom irónico e zombeteiro do, contrapondo-o ao ar calmo e austero do. Como recursos estilísticos, há que realçar a ironia, o eufemismo e o recurso a trocadilhos. Aspetos medievais e renascentistas da obra: Aspetos Medievais Inexistência de uma divisão externa (atos e cenas) da peça; Uso da redondilha maior; Conceção religiosa da vida humana (ideia do Juízo Final). Aspetos Renascentistas Existência de uma exposição, de um conflito e de desenlace; Dimensão crítica da peça.
4 "AUTO DA BARCA DO INFERNO" QUADRO SÍNTESE Personagens em Julgamento Símbolos cénicos Classes Sociais Acusações Defesa Caracterizaçã o Percurso cénico Outras personagens Alegóricas Figurantes Fidalgo Pajem, manto, cadeira Onzeneiro Bolsão Parvo (Joane) Sapateiro (Joanantão) Frade Joane não se faz acompanhar de símbolos cénicos, porque representa algo imaterial - a ausência de malícia. Há ainda quem justifique este facto, afirmando apenas que o Parvo não representa um vício concreto. Avental, várias formas Broquel, espada, casco, capelo e hábito; moça (artesãos) Clero Vida imoral; vida de prazer; tirania; vaidade Só pensava no dinheiro; vida imoral; avarento; viveu do lucro desenfreado e do juro excessivo Morreu excomungado; roubou o povo; praticou a falsa confissão; foi desonesto; nunca indemnizou os clientes Corrupção moral; frade amancebado; mundano Estatuto social; tem quem reze pela sua alma Levava o saco vazio O afirma que Joane não errou por malícia. Na realidade, ele é destituído de senso, por isso não se lhe pode imputar responsabilidade pelos seus atos. Morreu confessado e comungado; ouviu missas, ofereceu donativos à Igreja; assistiu à hora dos finados. Os outros também praticam a corrupção; confiante nas orações e no estatuto; enamorado; virtuoso Nobre, tirano, vaidoso, convencido Convencido, avarento Crítico, idiota, ingénuo, humilde, simples, cómico, irresponsável Viveu para as aparências, ladrão, mentiroso, desonesto Leviano, ocioso, licencioso, brigão, enamorado, dançarino Cais> Barca do Inferno> Barca da Glória> entra na Barca do Inferno Cais> B.I.> B.G> Cais> B.I.> BG> cais (onde fica a aguardar alguém merecedor de entrar na BG) Cais> BI.> B.G.> Companheiro do, Pajem Moça (Florença)
5 Alcoviteira (Brísida* Vaz) * ou Brízida 600 virgos postiços, 3 arcas de feitiços, 3 armários de mentir, 5 cofres de mexericos, furtos alheios, joias de vestir, guarda-roupa, casa movediça, estrado de cortiça, 2 almofadas, moças Levava uma vida imoral, dedicando-se à prostituição (desencaminhava jovens), à fraude / impostura, à feitiçaria e ao furto Foi mártir; levou açoites; sofreu tormentos; dava moças a molhos; criava as meninas para os cónegos da sé; é apostolada; é semelhante a um anjo; converteu muitas cachopas; arranjou marido para todas as raparigas; dormia pouco Falsa, meretriz, descarada, astuciosa, hipócrita, ladra, mentirosa Companheiro do ; Moças Judeu Bode Judeu Corregedor Carregado de processos, vara Burguesia/ (magistrado) Mijou na Igreja; comia carne no dia de N. Sr.; "ruim pessoa"; roubou o bode Deixou-se subornar; julgou com malícia; explorou os lavradores; não confessou tudo ao padre Tem direito a passar pelo dinheiro que tem; tem o mesmo direito que a Alcoviteira Confiante no seu estatuto; trabalhou muito; julgou com justiça e imparcialidade; os subornos eram um pecado da sua mulher. Avarento, julga que o dinheiro compra tudo Corrupto, mentiroso, parcial Cais> B.I (vai à toa) e Procurador Carregado de livros / pequena burguesia (magistrado) Não se confessou; roubou coelhos e pernas de perdigotos Confiava em Deus; não teve tempo para se confessar Bacharel, crente em Deus, ladrão Enforcado Corda no pescoço Bem-aventurado em morrer dependurado; fez bons feitos; o Senhor o escolheu para seu bem Crédulo, ignorante, ingénuo Cais> Entra na B.I. 4 Cavaleiros Cruz de Cristo, espadas, escudos (Cruzados) Lutaram e morreram por Deus; morreram nas terras dos mouros; estão livres de todo mal Cais> entram na B.G.
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