TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo

Transcrição

1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo fls. 2 ACÓRDÃO Registro: Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº , da Comarca de São Paulo, em que é apelante AF-MC EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA, é apelado FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 2ª Câmara Extraordinária de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmo. Desembargadores EUTÁLIO PORTO (Presidente sem voto), ROBERTO MARTINS DE SOUZA E BEATRIZ BRAGA. São Paulo, 15 de março de VERA ANGRISANI RELATOR Assinatura Eletrônica

2 2 fls. 3 VOTO Nº APELAÇÃO Nº COMARCA: SÃO PAULO APELANTE: AF-MC EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. APELADO: DELEGADO DO 17º OFÍCIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO MM. JUÍZ: DR. HENRIQUE RODRIGUERO CLAVISIO MANDADO DE SEGURANÇA. ITBI. Integralização de capital social através de conferência de bens imóveis. Ausência de registro do título aquisitivo no Cartório de Registro de Imóveis. Pretensão da cobrança do imposto contando como fato gerador a data do ato societário da incorporação. Inadmissibilidade. O fato gerador do ITBI só ocorre com a transferência efetiva da propriedade, com o registro no Cartório de Registro de Imóveis do instrumento de aquisição. Aplicação dos artigos e e 1º, ambos do Código Civil. Segurança concedida para que o tributo seja recolhido apenas no momento do registro da transmissão dos imóveis, calculado com base na alíquota vigente à época do registro, nos termos da legislação municipal. Sentença reformada. Recurso conhecido e provido. I- Trata-se de recurso de apelação interposto por AF-MC EMPREENDIMENTOS E PARTICIPAÇÕES LTDA. em autos de mandado de segurança por ela impetrado contra ato do DELEGADO DO 17º OFÍCIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO, da r. sentença de fls. 130/131 que denegou a ordem, sendo que a liminar não foi concedida. Inconformada, recorre a impetrante, pugnando pela inversão do julgado (fls. 180/189). contrarrazões às fls. 214/217. Recurso recebido às fls. 196 com

3 3 fls. 4 Os autos foram redistribuídos a esta Relatora em 20 de março de 2015, na forma da Resolução nº 683/2015 do Órgão Especial deste E. Tribunal de Justiça. É o relatório. II- O recurso é conhecido e comporta provimento. Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar impetrado contra ato do DELEGADO DO 17º OFÍCIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE SÃO PAULO, objetivando o direito dos sócios de proceder à incorporação dos imóveis descritos no ato societário para integralização de seu capital social sem a exigência de pagamento prévio do ITBI. Denegada a medida liminar. Com efeito, incide o ITBI apenas na transcrição do título de transferência no registro de imóveis, não podendo ser tributada a data da celebração do instrumento societário de incorporação, conforme pacífica jurisprudência do STJ (Resp /SP, RO em MS DF, AgReg no REsp /RJ). O art. 156, inciso II, da Constituição Federal estabelece a competência tributária para instituir e cobrar o ITBI - Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis, nos seguintes termos: Compete aos Municípios instituir impostos sobre: [...]

4 4 fls. 5 II - transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição. Desse modo, tem-se que a exigência do ITBI somente ocorre com a transferência efetiva da propriedade, que se dá com o registro imobiliário, não se operando a partir da incorporação dos imóveis ao patrimônio da impetrante. A respeito da exigência de pagamento de ITBI antes do registro do título translativo da propriedade, ensina Kiyoshi Harada 1 que (...) Convém ressaltar, que a transmissão da propriedade imobiliária só se opera com o registro do título de transferência no registro de imóveis competente, segundo o art do Código Civil, que assim prescreve: 'Transfere-se entre vivos a propriedade mediante registro do título translativo no 'Registro de Imóveis'. O 1º desse artigo dispõe enfaticamente que enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel. Portanto, a exigência do imposto antes da lavratura da escritura de compra e venda ou do contrato particular, quando for o caso, como consta da maioria das legislações municipais, é manifestamente inconstitucional. Esse pagamento antecipado do imposto não teria amparo no 7º do art. 150 da CF, que se refere à atribuição ao 'sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido'. [...].Por isso, o STJ já pacificou sua jurisprudência no sentido de que o ITBI deve incidir apenas 1 Direito Tributário Municipal, 2ª ed, São Paulo: Atlas, p. 100.

5 5 fls. 6 sobre transações registradas em cartório, que impliquem efetiva transmissão da propriedade imobiliária (REsp 1.066, , , , ; AGA ; ROMS ). Curvamo-nos à jurisprudência remansosa do STJ, reformulando nosso ponto de vista anterior, quer porque inaplicável o 7º do art. 150 da CF em relação ao ITBI, quer porque o fato gerador desse imposto, eleito pelo art. 35, II, do CTN em obediência ao disposto no art. 156, II, da CF, é uma situação jurídica, qual seja, a transmissão da propriedade imobiliária. Corroborando desse entendimento é a decisão do C. STF, conforme transcrição da ementa: Tribunal de Justiça: EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA À CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONTRATO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. NÃO INCIDÊNCIA DO ITBI. 1. Controvérsia decidida à luz de normas infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição do Brasil. 2. A celebração de contrato de compromisso de compra e venda não gera obrigação ao pagamento do ITBI. Agravo regimental a que se nega provimento (AI- AgR /MG, Rel. Min. EROS GRAU, T2, julgamento em 18/12/2006). Nesse sentido, é a posição do C. Superior Processual Civil e Tributário. ITBI. Recurso Especial interposto pela alínea 'b' do art. 105, III, da CF/88, após a entrada em vigor da EC 45/2004. Art. 148 do CTN. Súmula 211/STJ. ITBI. Fato gerador. (...). 3. O fato gerador do imposto de transmissão de bens imóveis ocorre com o registro da transferência da propriedade no cartório imobiliário, em conformidade com a lei civil. Precedentes. 4. Recurso especial conhecido em parte

6 6 fls. 7 e, nessa parte, provido. (REsp /SP, Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª T., j. em 12/06/2007, DJ 29/06/2007, p. 540). (grifamos). Esta E. Corte a respeito do tema já teve oportunidade de assim decidir: REEXAME NECESSÁRIO - EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL - ITBI gerado em Município de São Paulo - Transferência de bem imóvel à sociedade, para integralizar cota do capital social - Momento do fato gerador - Ocasião da transcrição do ato no Registro de Imóveis e não o instante da integralização cf. precedentes do STJ - Diferença - Não cabimento, pois o contribuinte comprovou o pagamento total do imposto por ocasião do registro do ato de transmissão. RECURSOS IMPROVIDOS (TJSP, 15ª Câm. Dir. Público, Apelação nº /7-00, Rel. Des. Rodrigues de Aguiar, j ). RECURSO - Mandado de segurança Integralização do capital social mediante conferência de bens - Ausência de registro no Cartório de Registro de Imóveis - Posterior alteração contratual, com redução do capital social e reincorporação dos imóveis ao patrimônio de seus sócios ITBI - O fato gerador do ITBI só ocorre com a transferência efetiva da propriedade, com o registro no Cartório de Registro de Imóveis - Precedentes do STJ - Sentença mantida - Recursos improvidos. (TJSP, 15ª Câm. Dir. Público, Apelação nº , Rel. Des. Eutálio Porto, j ). Nessa medida, vislumbra-se descabida a exigência tributária feita pela autoridade coatora, no que tange ao recolhimento do ITBI, desde a data da conferência de bens ao capital social da impetrante, uma vez que a obrigação tributária nasce com o registro imobiliário.

7 7 fls. 8 Conforme explicitado, não resta dúvida de que o fato gerador do ITBI é a transferência da propriedade imobiliária que se dá com o registro do respectivo título translativo perante o Registro de Imóveis, não podendo ser exigido do impetrante no ato integralização do capital social da sociedade mediante conferência de bens imóveis, por ausência da ocorrência do fato gerador. É caso, portanto, de o imposto em questão ser recolhido apenas no momento do registro da transmissão dos imóveis, sem acréscimos. Dessa forma, conforme o princípio da legalidade tributária estrita, não se admite a incidência do tributo sobre bens que não tenham sido transmitidos. Assim sendo, o lançamento e a cobrança do ITBI antes do registro imobiliário contrariam o ordenamento legal e devem ser afastados, ante a ausência do fato gerador. Posto isso, por meu voto, concedo a ordem para que o tributo seja recolhido apenas no momento do registro da transmissão dos imóveis, calculado com base na alíquota vigente à época do registro, nos termos da legislação municipal. Custas ex lege. Sem honorários. Para fins de prequestionamento, observo que a solução da lide não passa necessariamente pela restante legislação invocada e não declinada. Não se faz necessária a menção explícita

8 8 fls. 9 de dispositivos, consoante entendimento consagrado no Eg. Superior Tribunal de Justiça. Isto posto, conhece-se e dá-se provimento ao recurso para conceder a ordem. VERA ANGRISANI Relatora