Prof. Dr. Vander Ferreira de Andrade

Transcrição

1 Prof. Dr. Vander Ferreira de Andrade

2 Fundamento Constitucional dos Recursos Garantia individual do duplo grau de jurisdição, prevista implicitamente na Constituição Federal, voltada a assegurar que as decisões proferidas pelos órgãos de primeiro grau do Poder Judiciário não sejam únicas, mas submetidas a um juízo de reavaliação por instância superior. Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5.º, LV, CF)

3 Fundamento do Recurso O recurso tem seu fundamento na contingência humana, na falibilidade da cultura, da inteligência, da razão e da memória do homem, por mais culto, perspicaz e experiente que seja. Destina-se a sanar os defeitos graves ou substanciais da decisão, a injustiça da decisão, a má apreciação da prova, a errônea interpretação e aplicação da Lei, ou da norma jurídica, a errônea interpretação das pretensões das partes e a errônea apreciação dos fatos e das suas circunstâncias (BORGES DA ROSA: Comentários ao Código de Processo Penal).

4 Natureza Jurídica do Recurso O direito de peticionar ao Poder Judiciário para a obtenção de uma decisão aplicando a norma ao caso concreto, disciplinando conflitos de interesses e fazendo valer o poder punitivo do Estado, denomina-se direito de ação. Nessa medida, é preciso considerar o recurso como um mero desdobramento desse direito primário. Seria o segundo estágio para que o interessado obtenha o provimento jurisdicional almejado.

5 Características dos Recursos VOLUNTÁRIOS: sua interposição depende, exclusivamente, do desejo da parte de contrariar a decisão proferida (art. 574, CPP). Exceções: 1) Recursos de Ofício 2) Possibilidade de extensão dos efeitos do recurso de um apelante ao corréu, desde que o beneficie - art. 580, CPP - extensão subjetiva do efeito devolutivo do recurso (não se aplica a benefícios de caráter pessoal. Ex: se um dos autores é menor de 21 anos, a prescrição é computada pela metade. A punibilidade pode ser extinta, enquanto a dos demais coautores permanece íntegra)

6 Tempestivos: pressuposto de admissibilidade - não é viável a existência de um período indefinido para que o interessado demonstre seu inconformismo. Por isso, a lei fixa prazos para que tal se dê. Não se deve considerar recursos as ações autônomas (HC, MS, Revisão Criminal) As ações impugnativas podem voltar-se tanto contra decisões com trânsito em julgado ou simplesmente precluídas a outro recurso, como em relação a decisões em face das quais ainda é possível interpor recurso específico.

7 TAXATIVOS: o recurso deve estar expressamente previsto em lei, para que a parte interessada dele lance mão.

8 Efeitos dos Recursos O efeito devolutivo é regra geral, permitindo que o tribunal superior reveja integralmente a matéria controversa, sobre a qual houve o inconformismo. Cabe à instância superior avaliar matéria que lhe permite conhecimento de ofício (ex.: nulidade absoluta)

9 Efeitos dos Recursos O efeito suspensivo é excepcional, impedindo que a decisão produza consequências desde logo. Há situação a comportar imediata eficácia, como a sentença absolutória, provocando a imediata soltura do réu; outras, no entanto, submetem-se à eficácia contida, como a sentença condenatória, impondo pena privativa de liberdade, que não se executa, senão após o trânsito em julgado.

10 Efeitos dos Recursos Efeito regressivo: significa devolver ao mesmo órgão prolator da decisão a possibilidade de seu reexame, o que acontece com os embargos declaratórios e outros recursos, como o recurso em sentido estrito e o agravo em execução.

11 Recurso de Ofício Terminologia equivocada do CPP. O recurso é demonstração de inconformismo, visando à reforma do julgado; não cabe sustentar que o juiz, ao decidir uma questão, recorre de ofício de seu próprio julgado. Expressão correta: Duplo grau de jurisdição obrigatório ou reexame necessário. (art. 574, I, CPP) Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege. (Súmula 423 STF)

12 Hipóteses de Duplo Grau de Jurisdição Obrigatório Absolvição de acusados em crime contra a economia popular Absolvição de acusados em crime contra a saúde pública (exceto crimes da Lei de Drogas) Arquivamento dos autos do IP (Lei 1.521/51, art. 7.º). Quando o relator indefere liminarmente a revisão criminal Quando o Presidente do tribunal indefere liminarmente habeas corpus.

13 Desvio da Administração Pública no Processamento do Recurso Se algum recurso deixar de ser apresentado ou processado no prazo legal, em decorrência de ato faltoso de servidor público, é preciso garantir o seu seguimento à instância superior (art. 575, CPP). Súmula 320 STF: A apelação despachada pelo juiz no prazo legal não fica prejudicada pela demora da juntada, por culpa do cartório.

14 Impossibilidade de desistência do recurso do MP Princípio da Obrigatoriedade Princípio da Indisponibilidade: uma vez interposto o recurso (desdobramento do direito de ação), não pode o MP dele desistir (art. 576, CPP). Não é obrigatório o oferecimento do recurso, porque depende do convencimento pessoal do representante do MP acerca do acerto ou erro da decisão judicial, análise que se situa na órbita da sua independência funcional. Entretanto, feita a opção, desistência não pode ocorrer.

15 Impossibilidade de desistência do recurso do MP É possível que um promotor apresente petição de apelação, abrindo-se, depois, vista a outro representante do MP para oferecer as razões. Este último, não concordando com o recurso em andamento, dele não pode desistir, mas suas razões podem espelhar entendimento diverso do que seria compatível com o desejo de recorrer ( independência funcional do membro do MP).

16 Múltipla Legitimidade Recursal O recurso pode ser interposto pelo MP, pelo querelante, pelo réu pessoalmente, por seu procurador ou por seu defensor (art. 577, caput, CPP). Legitimação excepcional: o ofendido e as pessoas que o sucederem na ação penal (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão) podem recorrer Os assistentes de acusação podem recorrer O terceiro de boa-fé, cujo bem foi apreendido ou sequestrado

17 Interesse Recursal Pressuposto subjetivo para admissibilidade dos recursos: Não se admite recurso da parte que não tiver interesse na reforma ou modificação da decisão. (art. 577, parágrafo único, CPP) É viável a interposição de recurso pelo réu, ainda que tenha sido absolvido, apenas para modificar o fundamento utilizado pelo juiz, desde que influa no dispositivo da sentença, alterando, para melhor, a hipótese do art. 386 do CPP.

18 Pressupostos de Admissibilidade dos Recursos O recurso deve ser interposto por petição ou por termo nos autos (o que implica forma escrita), assinado pelo recorrente ou por seu representante legal. É possível que um réu manifeste seu desejo de recorrer, verbalmente, assim que toma conhecimento, na audiência ou no plenário do júri, da sentença condenatória, merecendo seu apelo ser devidamente processado, corrigindo-se, a seu tempo, a não formalização desse intento pela redução a termo.

19 Pressupostos de Admissibilidade dos Recursos Atualmente, está em vigor a Lei /2006 (Informatização do processo), motivo pelo qual, aos poucos, começam a surgir os casos de interposição de recurso pela Internet. Tudo depende da reformulação e regulação de cada Tribunal, inclusive do STF e do STJ. A verificação dos requisitos processuais de interposição do recurso, para que ele tenha seguimento e seja encaminhado à instância superior, deve ser feita, de regra, pelo órgão que proferiu a decisão.

20 Pressupostos de Admissibilidade dos Recursos A petição de interposição do recurso pode estar ou não acompanhada das razões (a fundamentação). Depende do caso. Existem recursos de fundamentação livre e de fundamentação vinculada. Aqueles comportam qualquer tipo de alegação, demonstrando o inconformismo da parte com a decisão proferida (apelação); estes devem ser apresentados contendo a descrição dos erros ou equívocos previamente descritos em lei (recurso extraordinário).

21 Pressupostos de Admissibilidade dos Recursos Da mesma forma que o juiz de primeiro grau pode negar seguimento ao recurso, o tribunal ad quem pode não conhecer do recurso interposto. Ambas as decisões são juízos de admissibilidade, cuidando de questões processuais. Determinado o processamento do recurso, não mais cabe ao juízo a quo obstar-lhe o seguimento, salvo quando expressamente autorizado em lei.

22 Pressupostos Objetivos dos Recursos Cabimento: deve haver previsão legal para a sua interposição. Adequação: a parte necessita respeitar o recurso exato indicado na lei para cada tipo de decisão impugnada, não lhe sendo cabível eleger o recurso que bem entenda. Tempestividade: respeito ao prazo estabelecido em lei para a interposição do recurso.

23 Pressupostos Subjetivos dos Recursos Interesse da parte: Sendo vencedora em todos os pontos sustentados, não havendo qualquer tipo de sucumbência, inexiste motivo para provocar outra instância a reavaliar a matéria. Legitimidade: o recurso precisa ser oferecido por quem é parte na relação processual, estando capacitado a fazê-lo, ou quando a lei expressamente autorize a interposição por terceiros.

24 Expressões relativas às Decisões Recursais Sustenta a doutrina que o acórdão, dando ou negando provimento ao recurso, sempre substitui a decisão recorrida, passando a ser a decisão a ser cumprida, motivo pelo qual se vê, nos processos, após a prolação da decisão do tribunal, a expressão Cumpra-se o Venerando Acórdão. Pode ainda ser mencionado: manutenção da decisão recorrida pelo órgão ad quem.

25 Impedimentos ao processamento ou conhecimento dos recursos Desistência: quando o réu, acompanhado de seu defensor, não mais deseja persistir no inconformismo, solicitando que o recurso cesse seu trâmite. Tal situação não é autorizada ao representante do MP. Renúncia: antes mesmo de ser apresentado, pode a parte sucumbida manifestar seu desejo de não recorrer da decisão. Também nesse caso não se ajusta a hipótese ao MP. Deserção: quando o réu deixa de pagar as custas devidas (art. 806, 2.º, parte final, CPP) ou de promover o traslado de peças dos autos (art. 601, 1.º, CPP, embora não expressamente prevista a deserção neste dispositivo legal).

26 Princípio da Fungibilidade dos Recursos A interposição de um recurso por outro, inexistindo má-fé ou erro grosseiro, não impede que seja ele processado e conhecido. Caso a parte esteja em dúvida, se é caso de interposição de recurso em sentido estrito ou apelação, mesmo porque a matéria é inédita ou controversa na doutrina ou na jurisprudência, é plausível que a opção feita seja devidamente encaminhada para a instância superior, merecendo ser devidamente avaliada.

27 Erro Grosseiro Erro grosseiro é aquele que evidencia completa e injustificável ignorância da parte, isto é, havendo nítida indicação na lei quanto ao recurso cabível e nenhuma divergência doutrinária e jurisprudencial, torna-se absurdo o equívoco, justificando-se a sua rejeição.

28 Má-Fé A má-fé surge em variados aspectos, embora o mais saliente seja a utilização de um determinado recurso unicamente para contornar a perda do prazo do realmente cabível.